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Pensatas

Guerra ao Uber: prefeitura de São Paulo irá usar o aplicativo para flagrar e punir motoristas “ilegais”

O aplicativo Uber já não enfrenta apenas a ira dos taxistas. A prefeitura de São Paulo entrou na guerra e pretende começar a usar o aplicativo para poder punir os motoristas que insistirem em utilizá-lo. Aprovada pela Câmara dos Vereadores em 30 de junho deste ano, a proibição ao aplicativo ainda tem de passar por votação em segundo turno e para a sanção do prefeito Fernando Haddad, mas seu secretário de transportes, Jilmar Tatto, disse que a lei é redundante.

Segundo ele, os táxis já detêm o monopólio sobre o serviço de transporte individual. O fundamento é a lei federal 12.468/11, que regulamenta a profissão de taxista e estabelece em seu art. 2º: “É atividade privativa dos profissionais taxistas a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, sete passageiros”. Independentemente da nova lei ou não, portanto, o Uber já poderia ser considerado ilegal em todo o país.

Quem quer que seja flagrado “invadindo” o território deste serviço pode ter o carro apreendido e ser multado em R$ 1.800,47. Para reaver o carro, são necessários mais R$ 700, pagos a título de taxa de remoção do automóvel. Só neste ano, 21 carros já foram pegos. Os que forem apreendidos uma segunda vez pagam o dobro da multa.

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As reações ao aplicativo não se limitam à cidade de São Paulo. Na França, elas se transformaram em protestos violentos dos taxistas de Paris, Marselha, Toulouse, Nice e Bordeaux no útlimo dia 25 de junho. Presente em 42 países, o aplicativo já gerou polêmica em quase todos, e aparentemente este é o início de uma longa guerra que os taxistas terminarão derrotados — ou ao menos aliados ao inimigo.

Olhando para a questão no Brasil, taxistas só conseguem entrar na profissão se tiverem um alvará de estacionamento e a licença para dirigir, chamada, em São Paulo, de Condutax. Para poder dirigir um táxi, o motorista tem de fazer o “Curso Especial de Treinamento e Orientação”, que leva 32 horas, não tem valor fixo e versa, entre outras coisas, sobre direção defensiva e primeiros-socorros. Também tem de apresentar uma série de documentos, entre eles CNH profissional, comprovante de residência, atestado de antecedentes criminais e o certificado do tal curso. Tudo isso é relativamente simples. O problema mesmo é conseguir o alvará.

Segundo a prefeitura, já existem 34 mil alvarás ativos em São Paulo. E ela diz categoricamente que não tem a menor intenção de emitir mais nenhum. Com isso, os alvarás existentes viraram investimento. Quem tem uma licença dessas investe o valor de um imóvel em sua compra e só o vê valorizar (ao contrário dos imóveis, que andam baixando de preço). E você nem precisa pagar IPTU!

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É lógico que a venda dos alvarás é proibida, mas isso não impede que ela aconteça. Basta uma conversa com qualquer taxista para saber como funciona. O alvará é alugado, comprado e vendido. Tem gente que faz disso meio de vida e compra tantos alvarás quanto consegue ter. Coloca um no nome da esposa, um no nome do filho, outro no nome do pai, da mãe e assim vai. Quem tiver dinheiro e parentes suficientes tem um investimento seguro a fazer. O aluguel dos alvarás paga as contas do mês e ainda sobra um bocado. Tudo com contratos de gaveta e por baixo dos panos. Existem empresas de táxi que alugam o veículo por dia, com o pagamento de valores médios de R$ 100 por diária, independentemente de quanto o motorista conseguir faturar. Imagine todo esse dinheiro circulando quando, de repente, surge um serviço que torna esses “imóveis” sem valor.

Além dos alvarás, os táxis também vivem uma explosão de cooperativas. Preocupados com a insegurança nas ruas, eles se reuniram para prestar serviços a grandes empresas, como bancos, por meio de boletos e outras facilidades de pagamento. São sempre acionados por telefone, na região em que se encontram, e nunca ficam muito tempo esperando por corridas em lugar nenhum. Os que fazem parte de cooperativas confessam que pouco ficam nos pontos e que quase nunca pegam passageiros nas ruas, um dos maiores fatores de risco para sequestros e assaltos.

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Além de ter um alvará, fazer parte de uma cooperativa também custa caro. O valor pode chegar a R$ 40.000, fora a mensalidade para manter a estrutura funcionando, que pode passar fácil do custo de um condomínio, por exemplo. Esse é o tamanho da encrenca que o Uber está comprando. Não por acaso, o presidente da Simtetaxis (Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores nas Empresas de Táxi em SP), Antônio Raimundo Matias dos Santos, o Ceará, disse em entrevista à Folha de S.Paulo que não tem como “conter a categoria” e que “vai ter morte”. Bravata ou não, é o tipo de coisa que não se ouve sem ficar com receio.

Prefeituras e governos também vêem fontes de arrecadação escaparem de suas mãos. Afinal, o Uber não exige alvará. Não exige Condutax nem nada do tipo. Quem controla o serviço é unicamente demanda. E, como ele tem sido muito elogiado, a demanda anda forte.

Será que eles conseguirão conter o avanço do Uber? É possível que sim, mas devem surgir novos aplicativos. Novas opções de transporte, como os carros autônomos. E muitas outras opções que transformarão o serviço de táxi em algo obsoleto. Se não hoje, em breve. Não dá para manter nada funcionando por decreto, por mais que as pessoas, governos e organizações se esforcem para isso. Um dia, a realidade se impõe, e quem não se adapta a ela costuma sofrer as consequências de sua resistência.