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História

Sauber Mercedes-Benz C11: o carro que revelou Michael Schumacher para o mundo

Antes de se tornar dono de uma equipe de Fórmula 1, Peter Sauber fez algo talvez mais importante para a Fórmula 1 como um todo: colocou o nome de um jovem piloto alemão em evidência ao dar a ele um lugar ao volante de seu último protótipo bem sucedido: o Mercedes-Benz C11. O piloto? Michael Schumacher.

Sauber começou a construir carros em 1970. O primeiro deles se chamava C1 — “C” porque a esposa de Sauber se chamava Christine, e “1” porque era o primeiro carro. Nos anos que se seguiram, seus carros (sempre numerados em sequência) participaram de campeonatos locais e regionais na Suíça. O último e mais bem sucedido deles, o C5, com um motor BMW, até participou das 24 Horas de Le Mans em 1977 e 1978.

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Sauber C1

Na virada da década, Sauber se concentrou em projetar monopostos para a Fórmula 2 e, em 1980 e 1981, inscreveu um BMW M1 nos 1000 km de Nürburgring — vencendo a corrida de 81 com Hans Stuck e Nelson Piquet ao volante. No ano seguinte, voltaria aos protótipos.

Começando com o C6 — dando continuidade a sua sequência numérica — seus primeiros carros não obtiveram resultados dos melhores — o C8, por exemplo, sequer conseguiu começar a corrida na edição de 1985 das 24 Horas de Le Mans (e não terminou a prova nos anos seguintes).

A fabricante alemã cedeu à Team Sauber o M117, um V8 de cinco litros, projetado para uso nas ruas e usado em vários modelos da marca nas décadas de 70, 80 e 90. Equipado com dois turbos KKK, o motor — que rendia, no máximo, 220 cv nas versões de rua — alcançou picos de potência de 950 cv (!!), porém foi recalibrado para “apenas” 700 cv antes de competir, a fim de evitar que consumisse mais combustível do que o permitido pelo regulamento do Grupo C. Com este motor, o C8 era capaz de atingir 370 km/h. Em 1986, o carro venceu os 1000 km de Nürburgring com Henri Pescarolo e Mike Thackwell ao volante — e esta vitória foi encarada como um sinal de que a parceria poderia dar certo.

Em 1987, Sauber apresentou o C9. O sucesso em Le Mans, contudo, não veio instantaneamente: naquele ano, o carro não terminou a corrida de 24 Horas. A situação melhoraria no ano seguinte, com o carro terminando em segundo na categoria C1. Em 1989, um novo motor e a consagração: o M117 foi substituído pelo M119, mais leve, com cabeçote de alumínio, quatro válvulas por cilindro em vez de duas e comando duplo em cada um dos cabeçotes — e o C9 venceu as 24 Horas de Le Mans Jochen Mass, Manuel Reuter e Stanley Dickens revezando o volante.

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Sauber C9

Apesar da demora para vencer em Le Mans, o C9 marcou dois grandes acontecimentos: pela primeira vez a equipe competia como Sauber Mercedes (antes disso, o nome era Kouros Racing) e, ainda mais importante, marcava o retorno das Flechas de Prata às 24 Horas de Le Mans. Desde a Tragédia de Le Mans em 1955, quando um um Mercedes foi atingido na traseira por um Austin-Healey e voou em direção à arquibancada, matando 83 espectadores e o piloto Pierre Levegh, e ferindo outras 120, a Mercedes esteve afastada do automobilismo por quase três décadas.

Outra conquista do C9 foi atingir 400 km/h na reta Mulsanne de La Sarthe — uma das maiores velocidades já atingidas no trecho. Depois disso, foram instaladas as infames chicanes.

Se a vitória do C9 em 1989 foi a primeira vitória da Sauber Mercedes em Le Mans, no ano seguinte seu sucessor, o C11, daria à equipe sua última.

O carro projetado para 1990 era, na verdade, uma atualização do C9  — visto que o V8 leve e a carroceria aerodinâmica se mostraram uma combinação excelente. Contudo, o carro já tinha três anos e a Sauber temia que a concorrência tivesse evoluído. Eles não poderiam ficar parados.

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Confiante, a Mercedes batizou o carro de Mercedes-Benz C11 (e não Sauber C11) O V8 de comando quádruplo e 720 cv continuava, mas a carroceria ganhou uma aerodinâmica mais refinada e visual mais agressivo. A grande novidade, porém, estava debaixo dela: a estrutura do carro não usava mais alumínio, e sim fibra de carbono — em uso na Fórmula 1 desde o início dos anos 80, porém ainda relativamente nova nas outras categorias do automobilismo.

Leo Russ, projetista da equipe, deu atenção especial à seção anterior do carro. A frente era mais baixa e as caixas de roda tinham uma curvatura suave em direção ao centro do carro — o que ajudava o ar que não escorresse pelas laterais a ser direcionado para baixo do carro, para baixo do difusor dianteiro (gerando mais downforce) ou para as entradas de ar do radiador (ajudando a resfriar o motor). Era  uma solução relativamente simples, mas bastante inteligente.

O carro certamente seria bem sucedido em Le Mans se a Mercedes não tivesse decidido deixar a prova de lado — naquele ano, a prova não faria parte do calendário do World Sportscar Championship (WSC). A Mercedes queria vencer o campeonato, e julgou Le Mans uma distração desnecessária. Será que a Jaguar teria vencido a prova se a Mercedes tivesse entrado?

E, ainda por cima, gritando desse jeito?

Nunca saberemos a resposta para esta pergunta, mas sabemos de outra coisa: o carro dominou completamente o WSC em 1990.

A temporada daquele ano teve 9 corridas. Na primeira delas, o carro participou apenas da classificação — a corrida em si foi disputada pelo C9 do ano anterior. Isto, porém, é apenas um detalhe: além do C11, o destaque daquele ano foi o novato Michael Schumacher, então com 21 anos.

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Olha só o nome na lateral, ao lado da bandeira da Alemanha

Schumi, recém-saído da Fórmula 3, disputou apenas 3 das 9 corridas — o bastante para terminar o ano em quinto na classificação geral dos pilotos. Seu melhor desempenho foi justamente a última corrida, os 480 km do México, disputado no autódromo Hermanos Rodriguez, na cidade do México. Schumacher não apenas venceu a prova como também deu a volta mais rápida no circuito.

Tendo vencido todas as corridas, com exceção da prova disputada em Silverstone, a equipe ficou com o título do WSC.

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Mercedes-Benz C291

Para o ano seguinte, a Sauber-Mercedes decidiu criar outro carro — o C291, movido por um flat-12  aspirado de 3,5 litros. O motor era novo, mas menos potente, com 650 cv, para cumprir o novo regulamento, e o carro em si tinha design ultrapassado, e a equipe não conseguiu nenhum título com ele. Seu desempenho fraco motivou a Sauber-Mercedes a levar o C11 para disputar as 24 Horas de Le Mans em junho.

O carro foi inscrito com Schumacher, Karl Wendlinger e Fritz Kreuzpointner como pilotos e, como não poderia deixar de ser, o carro era um dos favoritos para a vitória e, de fato, esteve no pelotão da frente durante as primeiras horas da corrida. Contudo, depois de um pit stop, Wendlinger rodou (por causa dos pneus frios, talvez) e acertou o muro. O carro foi levado para os boxes e conseguiu voltar à corrida — e Schumacher, em uma perfomance brilhante, ainda conseguiu terminar em quinto — atrás de outra lenda, o Mazda 787B.

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Conseguindo mais três vitórias em sua categoria em 1991, o C11 foi definitivamente aposentado — não sem antes revelar ao mundo um dos maiores pilotos de todos os tempos. Schumacher disputou sua primeira corrida de Fórmula 1 ainda naquele ano, depois que a Mercedes pagou US$ 150 mil para que o piloto disputasse uma corrida pela Jordan e, no ano seguinte, pela Benetton, ao lado de Nelson Piquet. E o resto é história.

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Schumacher, Benetton, Spa-Francorchamps

Chega a ser injusto que um carro tão importante não seja tão lembrado como alguns contemporâneos por ser o último vencedor de sua linhagem. Assim como Schumacher, a Sauber migraria para a Fórmula 1 em 1992, estreando em 1993 — novamente em parceria com a Mercedes-Benz, que forneceu recursos técnicos e financeiros.

Porém, 21 anos depois, o C11 ainda é seu último grande sucesso. Para homenageá-lo, fique com esta bela galeria.

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[Fotos: Dave_George, Chris Wevers, Mark A Lacey, Club Mercedes Passion,  Stijn Braes, Hipwell Photography, ajwCA,  Dave Rook, Joan Garau, Michel Vaillant, mendaman]