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Project Cars Project Cars #16

Project Cars #16 – o shakedown do Kadett 2.4 e a evolução nos track days

Depois de pronta a primeira parte do projeto e agora com o motor devidamente acertado, havia chegado o momento de ir para a pista chacoalhar as peças e ver se tudo ficaria no lugar. Era a hora do shakedown!

Como eu disse no post anterior, dessa vez eu quero compartilhar com vocês a evolução do Kadett nos eventos de trackday, o que deu certo e o que deu errado, as novas peças e as ideias que foram surgindo no meio desse caminho.

Minha primeira participação em trackdays não foi com o Kadett. Alguns anos antes, na época do Marea Turbo, entre os anos de 2004 e 2009, eu já tinha experimentado o gostinho das pistas em eventos organizados pelo FIAT Clube e pelo próprio Clube do Marea, nos autódromos de Goiânia e Brasília.

Voltando ao Kadett…

A estreia estava planejada para acontecer no circuito brasiliense, distante 200 km da capital goiana. Não tinha mencionado antes, mas a proposta do meu trackcar também incluía a capacidade de rodar a distância da viagem de ida, andar o dia todo na pista e voltar inteiro para casa na viagem de volta. Um desafio, não acham?

Lógico que bateu aquela ansiedade na estreia, por isso caprichei no ritual preparatório: carro abastecido, revisado, ferramentas no porta-malas, muita fé no coração e pé na estrada! Tudo correu certinho nos primeiros quilômetros, mas não demorou muito e um barulho estranho apareceu. O amortecedor traseiro direito tinha perdido a carga e estava molenga, causando uma batida seca e irritante. Resolvi continuar a viagem mesmo assim, com o plano de ir para a pista e ver se mais alguma coisa iria abrir o bico.

Percorridos os 200 km da viagem de ida, cheguei ao autódromo sem maiores problemas. Depois de confirmar inscrição, realizar a vistoria e a adesivagem, era chegada a hora do teste verdadeiro.

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Na primeira bateria, após algumas voltas de aquecimento e ambientação com o carro, percebi um problema: dificuldade de engatar 3ª e 4ª marchas acima de 5.000 rpm. Mesmo assim, continuei na pista consciente de ter que trocar marcha mais lentamente e talvez com giro mais baixo. Afinal de contas, era o shakedown e eu precisava continuar!

Por causa desse contratempo, tive que pular de 3ª para 5ª marcha várias vezes, matando a tocada do carro. Não pude me concentrar mais no traçado da pista por causa disso, pois fiquei olhando para o conta-giros, tentando acertar as marchas. Mesmo com essas dificuldades, na 1ª bateria consegui virar 2:45,858.

No intervalo,  o “caroneiro” que aparece no vídeo, um amigo bastante experiente em trackdays, me deu dicas muito valiosas sobre pressão dos pneus, observando a temperatura e o desgaste da borda. Estava com pressão em excesso nos pneus dianteiros, então tiramos algumas libras. O pneu traseiro direito também estava raspando na lata, daí fizemos um “trabalho de funilaria” na base da martelada.

Depois dessas dicas, a partir da segunda bateria me senti mais confiante e tentei uma tocada mais agressiva. Mas, como nem tudo são flores, após duas ou três voltas, senti que tinha perdido a 4ª marcha, que não entrava mais de jeito nenhum. Não adiantava insistir. Encostei o carro no box e encerrei o dia.

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No geral, esse evento foi pra mim um ótimo aprendizado no desenvolvimento e no conhecimento do carro, que apresentou muito potencial. Depois que saí do autódromo, as marchas para frente passaram a engatar, inclusive a 4ª. Resolvi encarar a viagem de volta assim mesmo. Abasteci o carro, recalibrei os pneus e ‘bora pra Goiás. Mesmo com os problemas no amortecedor e no câmbio, que não incomodaram no trajeto de retorno, cheguei em casa são e salvo.

Na sequência, devido aos problemas, decidi internar o carro para descobrir o defeito do câmbio. O primeiro suspeito foi o platô da embreagem dando pouco curso e não debreando o suficiente. Troquei por outro da Displatec, fabricado em lona HD (heavy duty).

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Não resolveu! O próximo suspeito seria o acionamento do câmbio através de trambulador por varão. Meu pai teve dois Monzas (um SL 1984 e um Classic 1990) e quando eu os dirigia sempre achava aqueles engates GM imprecisos. Agora era minha vez com o Kadett, então resolvi atualizar o sistema para um mais moderno.

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O bom desses motores e câmbios Família 1 e 2 da GM é que eles têm muitas peças intercambiáveis, algumas delas até mesmo plug-n-play. Por isso, baseado nas dicas de alguns colegas, comprei o trambulador do Prisma – de acionamento a cabo, e a tampa do câmbio para completar o sistema.

Os engates ficaram perfeitos; melhorou 300% o engate da ré e uns 50% os outros engates. Considero que valeu muito a pena a adaptação. Fiz os testes na rua, porém não resolveu a dificuldade de engatar acima de 5.000 rpm.

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Descartada hipótese do acionamento por varão, agora a suspeita recaía sobre o óleo de câmbio e os anéis sincronizados. Dessa vez, levei a caixa de mudanças para o especialista que trabalha para as equipes de competição aqui da região. Os sincronizados estavam zerados, mas havia dois erros de montagem nas engrenagens: a ré estava montada errada (uma das minhas dificuldades) e tinha uma trava montada desnecessariamente (a mais) no conjunto. Essa trava limitou uma folga e acabou fundindo.

Em resumo, o câmbio foi remontado corretamente, com embreagem, juntas e retentores novos. Além disso,  usamos o óleo recomendado pela GM (Isafluido 556). Peguei o carro e testei uma puxada de 1ª até 5ª marcha, trocando tudo a 6500rpm. O resultado vocês podem ver no vídeo:

Não tinha mencionado antes, mas trata-se de um câmbio com capa seca F16 e engrenagens do Kadett GSI, com as seguintes relações: 1ª 3,55, 2ª 2,16, 3ª 1,48, 4ª 1,12, 5ª 0,89. Diferencial 4,19

Vencida a batalha contra o câmbio, agora era necessário resolver o problema dos amortecedores. Os dianteiros ainda estavam bons, então decidi enfiar o pé na jaca e importei os traseiros da Bilstein. Aproveitando a mão na massa, troquei também as molas e instalei outras mais rígidas, com 600 lb de carga na dianteira e 900 lb na traseira.

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Como se pode ver nas fotos, as molas ficaram um pouco menores que as originais, correndo risco de “pularem” do encaixe. Então providenciamos uma corrente para limitar o eixo e revestimos a base das molas dianteiras com mangueira para não girarem no prato. O carro ficou com a traseira bem baixa, com o pneu entrando 5 cm no paralama. A frente baixou 2,5 cm além do que eu já usava e passou a responder as ondulações do asfalto sem flutuar e sem ficar travada demais.

E como uma coisa puxa a outra, já que o carro estava erguido, mandei instalar também uma barra estabilizadora traseira mais grossa, de 19 mm (a original mede 16mm), guarnecidas por buchas de PU. Na foto abaixo, dá para perceber a diferença de espessura e, consequentemente, de rigidez entre as barras estabilizadoras.

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Na sequência das modificações necessárias a uma melhor performance na pista, instalei dutos de ar para refrigerar os freios, que superaquecem em situação de corrida. Comprei dois dutos de duas polegadas (aprox. 5 cm) numa loja de som automotivo (aqueles de caixa de grave dutada) e um tubo de alumínio.

Marquei a posição, furei com serra-copo, encaixei o duto e o cano, prendi com abraçadeira, posicionei com tireup (cinta hellerman, para alguns) e pronto! A princípio achei o duto estreito, mas o resultado final ficou bastante funcional e aceitável esteticamente.

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E para coroar o pacote importei um diferencial de deslizamento limitado (LSD) da Quaife Engineering.

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Finalizados os upgrades, era hora de testá-los na pista. A primeira oportunidade que surgiu foi uma etapa do Campeonato Centro-Oeste de Arrancada, que ocorreu em agosto de 2012. Confesso que o quarto de milha não é muito minha praia, mas resolvi testar o Kadett frente a frente com o pinheirinho.

Resultado: 3º lugar na categoria Rua Aspirado. Olhem a alegria da criança no pódio:

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Ficaram para trás um Chevette AP, um Logus, um Corsa 2.0 e um Audi R8 V10 que se inscreveu na categoria errada e foi desclassificado. Regras são regras!

Troféu na prateleira, decidi alçar voos mais altos: um trackday na Fazenda Capuava. Para quem não conhece, é um autódromo construído no meio de uma fazenda no interior de São Paulo, em Indaiatuba. Se Nordschleife é chamado de Green Hell, a Fazenda Capuava bem que poderia ser apelidada de Green Heaven. Aquilo é um paraíso!!!

Digo isso porque andar em Capuava foi simplesmente a experiência mais fantástica que tive numa trackday. Em resumo: piloto – carro – pista. Sem frescuras, sem público, só um dia para você e o seu carro. Saí de Goiânia, rodei 1.700km (ida e volta), andei forte por 26 voltas e não amarelei pra ninguém.

O traçado é bem técnico e travado, exigindo bastante do piloto, inclusive fisicamente. Meu carro não tem direção hidráulica, ABS e EBD ou seja, zero de assistência, então me senti literalmente brigando com o carro o tempo todo, quase igual à sensação do kart. Sem contar que alguns trechos exigem atenção redobrada na pilotagem, pois errar pode significar um prejuízo enorme. Rodei três vezes em pontos diferentes, sendo uma delas por extrapolar o limite do carro. Mas foi um ótimo aprendizado; se eu tivesse mais tempo e pudesse arriscar mais com o carro, sem ter que preservá-lo para a volta pra casa, eu teria certamente buscado um traçado melhor e beliscado uns décimos a menos no meu tempo.

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Sobre o carro, me surpreendi com o resultado. Confesso que tinha uma visão negativa dele, pelas experiências anteriores em Brasília. Agora com o câmbio arrumado, foi a vez de testar a suspensão. E o resultado foi bem otimista. Achei o carro mais neutro, com leve característica dianteira. O alinhamento foi feito para rua, sem cambagem negativa e sem acerto de caster. Também foi a estreia do diferencial Quaife, que me deu bastante confiança para abusar das curvas, pois, mesmo em se tratando de um carro com tração dianteira, o diferencial reduziu bastante o efeito do understeering (ou saída de frente).

No mais, o carro foi e voltou inteiro, não esquentou, não baixou pressão de óleo, não fez barulho. Nas fotos o Kadett aparece sujo, mas a culpa não é minha. Até tentei jogar água mineral nos pneus, mas 1 roda consumiu 1 garrafinha, aí desisti, por óbvio. A estrada que dá acesso à casa-sede é de terra e não há boxes ou paddock. Só tem mesmo um acesso pra pista e um calibrador. Roots!!!

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De volta para casa, aproveitando o embalo da viagem, acabei me inscrevendo em outro trackday, dessa vez no mês de outubro de 2012, na minha cidade mesmo, no Autódromo Internacional de Goiânia.

Andei muitas voltas, interagi bastante com o carro, onde pude conhecer algumas reações como freada de alta, saída de traseira, entre outras. Para terem uma ideia, meu tempo oficial foi 1:53,935. Os Corsas do campeonato de Marcas e Pilotos viram 1:50 na corrida e na tomada de tempo o pole position crava 1:46 Um amigo tinha virado 1:56 numa Audi S4 e 1:54 numa BMW M5. Ou seja, o Kadett não fez feio não.

Esse tempo de 1:53:935 veio com o mesmo setup de Capuava, sem cambagem, só mesmo acerto de calibragem.

Depois dessa sequência de três eventos, tinha chegado a hora de internar o carro para uma revisão. Aproveitei para fazer aletas no cárter, para evitar que numa curva acentuada o óleo subisse para as laterais, deixando o pescador puxando ar. Aproveitei o pit stop e acrescentei polimento dos dutos de lubrificação do bloco para o óleo descer mais rápido para o cárter; bomba de óleo nova; radiador de óleo do Kadett GSi com flange tipo termostática que abre só a 82ºC; cambagem de 2.5 graus negativos na frente; e instalei um scoop da S10 no capô, visando captar ar frio para a admissão.

Depois da revisão, novamente me inscrevi em outro trackday na Fazenda Capuava, isso em dezembro de 2012.

Fiz a viagem de ida e volta de Goiânia a Indaiatuba viajando com a esposa e o carro lotado de tralhas, rodas reservas com pneus slicks, caixa de ferramentas, malas etc. O carro foi e voltou lisinho, fazendo 7 km/l de etanol.

Minha expectativa era baixar o tempo anterior de 1:49,935 na pista seca com pneus R888. Dessa vez, com novo acerto de suspensão e slicks eu queria entrar na casa dos 1:45, mas a chuva não deixou! Isso mesmo, a chuva! Não foi chuva torrencial, mas tivemos aquela garoa constante a maior parte do dia. Isso mudou bastante os planos, mas o Kadett novamente surpreendeu!

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Logo na primeira rodada de baterias (A, B e C, divididas por potência) eu já cravei o melhor tempo. Na segunda sequência de baterias eu me mantive em 5º lugar. A chuva continuou caindo, alguns carros fortes foram marcando bons tempos, outros abandonaram por quebras ou batidas, e o Kadett foi caindo até a 9ª colocação.

No final do dia, tivemos um momento de pista livre. O asfalto já tinha um traçado quase seco, mas ainda havia muitas áreas molhadas.

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Nessa última bateria consegui dar umas 9 voltas, mais no intuito de me divertir com o Kadett, porque a esta altura do campeonato os carros das baterias A, B e C já estavam todos misturados. Então, na última volta antes de finalizar aquela sessão eu consegui botar o carro no trilho e cravei 1:50,103!

Foi um mega tempo — pulei de 9º para 4º lugar e assim fiquei até o final. Depois disso a chuva caiu de vez e a pista foi fechada. Quem tinha marcado tempo marcou, quem não conseguiu ficou pra próxima. Vejam a lista dos sete primeiros:

  1. 48-Nissan GT-R R35, 1:41,152
  2. 58-Porsche 914/6, 1:48,223
  3. 61-Mitsubishi Lancer EVO VIII, 1:48,449
  4. 34-Chevrolet Kadett, 1:50,103
  5. 15-BMW M3, 1:52,088
  6. 44-Honda Civic, 1:52,566
  7. 39-Volkswagen Jetta, 1:52,811

E aqui está o vídeo desta proeza, que expressa muito bem como o carro estava animal (esse vale a pena assistir inteiro!!!):

Depois de Capuava, o evento seguinte ocorreu novamente em Brasília, em março de 2013. No período de férias, aproveitei para instalar pinças Wilwood de quatro pistões na dianteira e discos de freio ventilados de 284 mm. Nem preciso dizer os motivos, né?!

Sem outras novidades mecânicas, com exceção dos freios, o grande momento desse trackday foi uma disputa com um Civic Si, registrada pelas câmeras dos dois carros. O primeiro vídeo contém minha visão e o segundo tem a perspectiva do Civic.

E para fechar com chave de ouro o ano de 2013, tive o privilégio de participar de um trackday no autódromo construído pela Mitsubishi, o Velocittà, em Mogi-Guaçu (SP).

A viagem de Goiânia a Mogi foi bem tranquila, sem stress. No sábado de manhã cheguei cedo no autódromo, por volta das 07:10, e já marquei meu território na área coberta. Pista liberada, deu aquela ansiedade por não conhecer nada, mas ainda assim fui para uma volta de reconhecimento. No meu feeling achei três curvas difíceis:

– a curva três: depois de fazer vários testes, vi que eu tinha de frear bastante para entrar. Muitas vezes eu entrei rápido demais e o carro arrastava a frente. Infelizmente só descobri isso no final do dia, mas foi bem interessante o aprendizado.

– a curva da entrada dos boxes: é um parábola que quebra de uma vez, então se você vier no traçado instintivo, que é pelo meio, o carro espalha demais e acaba indo pra grama. A ideia é fazer bem aberto, como se estivesse entrando para os boxes, matar a velocidade e entrar no apexi.

– a curva da vitória: achei bem malandrinha no início, mas depois que acertei a calibragem, comecei a fazer dando um totó no freio no meio da curva para deliberadamente deslizar um pouco a traseira e já entrar apontando.

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O temido S após a “descida dos macacos” na minha opinião não foi difícil. Achei uma telemetria da Porsche Cup que vazou na internet uns dias antes do evento e que me ajudou a ver que devia dar um leve toque no freio na segunda perna da curva, ajudando a frente a apontar.

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Também não achei a descida apavorante. Meu câmbio cortava 4ª marcha na placa de 150 m. Se eu passasse 5ª, chegaria vendido e teria que reduzir 2 marchas e frear muito tarde, correndo sério risco de perder o carro. Então escolhi chegar no corte da 4ª, deixar 50 m de freio motor e frear na placa dos 100 m, quando o carro já estava mais devagar. Acho que por isso não senti tanto medo nesse trecho.

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Para ilustrar, segue a listagem com a cronometragem do dia. Mais um vez, o Kadett ficou entre os “ponteiros”:

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E aqui está o registro da minha melhor volta, com direito ao caroneiro segurando a moldura dos instrumentos, que resolveu cair bem na hora.

No mais, acho que valeu cada centavo e cada quilômetro rodado!

That’s all folks! No próximo post, falarei mais sobre os acertos que me permitiram melhorar bastante os tempos na cronometragem nos eventos que se seguiram e também os erros que me levaram a sair da pista, literalmente! E como tudo isso vai influenciar no futuro do projeto Kadett Evolution.

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Abraços!

Por Weiler Júnior, Project Cars #16

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