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Project Cars Project Cars #166

Project Cars #166: vidros novos e a restauração do motor do meu Dodge Magnum 1979

Fala, galera do FlatOut! Aqui é Rodolfo Schmidt quem vos fala novamente. No primeiro post contei um pouco da história do carro no Brasil e como ele chegou à nossa casa. Desta vez o texto será para detalhar o que foi feito no Dojão azul, obviamente as partes mais marcantes, pois se fosse para contar tudo em detalhes seria necessário uns 20 textos, pois ele está há mais tempo na família que eu mesmo. Até mesmo pela extensão dos problemas e outros detalhes eu resolvi dividir o texto em tópicos para facilitar a leitura, sem me ater a ordem cronológica. Então, sentem-se, peguem a pipoca e se preparem porque começa agora meu TCC.

 

Troca do para-brisa

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Quando meu pai comprou o Magnum, ele apresentava um ou outro defeito, como qualquer carro com quase 10 anos de uso, e um desses defeitos era um pequeno trincado – em torno de 10 cm – no vidro dianteiro, saindo exatamente da quina inferior do lado do carona em um ângulo que apontava para o centro do vidro. Na verdade trincado não seria a palavra certa, pois o vidro não estava rachado, e sim que havia entrado ar entre as duas lâminas de vidro. Era tão insignificante que apenas colocando o adesivo de identificação do prédio onde morávamos não era mais possível notá-lo. Acontece que no ano de 1991 o carro precisou fazer um serviço na garagem do prédio.

Meu pai levou os mecânicos da antiga autorizada Dodge para fazerem o que era necessário, porém o serviço acabou não sendo finalizado no mesmo final de semana. Como foi necessário retirar as rodas dianteiras do carro e eles não tinham cavaletes, os caras resolveram apoiá-lo nas próprias rodas deitadas sob as portas. Pra quem não sabe a estrutura do Dodge é de semi-chassi. Ele possui longarinas que vão até QUASE o meio do carro na frente e atrás, ou seja, bem no meio ele tem um pedaço se não estou enganado em torno de 1 metro sem longarina. Já viram né. O carro ficou a semana inteira com aquela frente pesada pra caramba em balanço. No fim de semana seguinte meu pai entra na garagem e toma um baita susto. O “trincado” tinha ido até o meio (!) do pára-brisa. A frente fletiu milimetricamente, o bastante para forçar o vidro e fazer o estrago. Algum tempo depois meu pai procurou uma oficina para fazer um serviço de segurança no vidro, que consistia em injetar uma cola ali dentro.

Durante muito tempo e até no Detran ele apresentava a nota do serviço e passava tranquilo pelas vistorias e outras situações. Até que depois de bons anos já morando no interior o pessoal do Detran começou a falar que o carro não ia passar na vistoria, porque os fiscais passariam a vir do Rio. Enfim chegou o momento de trocar o vidro. Meu pai conseguiu através de uma empresa do sul importar o pára-brisa do carro, e eu importei a borracha. Agora só faltava alguém para trocar o bendito. Entre diversas conversas com “profissionais” do ramo um pessoal de uma oficina que faz exatamente o serviço de troca de vidros aceitou fazer o serviço, porém já começaram falando besteira ao falar que precisariam cortar pequenos pedaços nas quinas da borracha para fazer o vidro encaixar. Tenso. Meu pai apreensivo por não ter sentido firmeza nos caras, mas pagamos pra ver. Chegou o dia de eles irem até nossa casa instalar o vidro novo e… não foram! Foi um misto de frustração e alívio.

Depois da decepção inicial estávamos sem saída. Daí meu pai resolveu: iríamos trocar nós mesmos o vidro. Seria bom porque daria inclusive para fazer qualquer pequeno reparo necessário na moldura, seja por ferrugem ou simplesmente cuidado extra. E assim removemos os frisos de inox, a borracha velha e o vidro. Meu pai realizou os reparos esperados, inclusive pintando algumas partes, e finalmente nós dois, até com a ajuda da minha mãe, colocamos o vidro no lugar. Pensem em um trambolho pesado. O ideal na instalação é assentá-lo na parte inferior e com o auxílio de uma espátula emborrachada ir fazendo a borracha “abraçar” o vidro, primeiro pelas laterais e por último na parte de cima.

Com o vidro no lugar era a hora de encaixar os frisos novamente nos grampos, serviço relativamente fácil até chegar ao último friso, o do meio do vidro próximo ao teto. Tive que subir no teto do carro para conseguir fazer a força necessária para ele encaixar, tomando o devido cuidado de não colocar todo o serviço a perder trincando o vidro. Depois disso só faltava complementar a vedação da borracha com massa de calafetar e voilà, vidro novo, idêntico ao original de fábrica, instalado perfeitamente na garagem de casa.

 

Parte elétrica

O sistema elétrico deste carro é muito simples, apesar de ser o sistema precursor da injeção eletrônica. Consiste basicamente dos componentes a seguir:

– Bateria (AC Delco 65 Ah)

– Bobina (Bosch e Accel)

– Distribuidor (Wapsa e Proform)

– Ignição eletrônica (Mopar)

– Cabos de Vela (Accel)

– Velas (NGK)

– Regulador de voltagem (Wapsa e Gauss)

A bobina Bosch está atualmente instalada no carro e supre muito bem a necessidade dele, além de ser fácil de achar, pois serve em Opalas e outros carros. A bobina Accel importamos por uma questão de performance mesmo, pois ela tem uma voltagem de saída de até 45.000V, dando uma faísca bem consistente nas velas, o distibuidor original ainda está funcionando, porém depois de também dar uma surra em nós até descobrirmos que o problema não era nele acabamos deixando um mais novo no lugar.

A ignição eletrônica Mopar Orange aguenta mais que a original, controlando os demais componentes até 6.000 rpm. Como não dirigia o carro antes da troca da ignição original por essa não sei dizer se teria uma melhora perceptível no trabalho do carro. Possuímos a Mopar Chrome também, que trabalha a até 8.000 rpm, mas sem preparação não precisamos dela por hora.

Por causa de sua simplicidade, se torna relativamente fácil mexer nestes componentes, agora identificar os problemas que eles dão sem trocar o suspeito por outro novo é um trabalho para Sherlock Holmes. Quando apresentam defeitos, dificilmente eles levantam os bracinhos e falam “Fui eu, fui eu que fiz você ficar a pé!!!”, e pior, costumam ser defeitos intermitentes, vão e voltam, alteram o trabalho do carro do nada e voltam a funcionar do nada tão rápido como começaram, além de, no caso do módulo de ignição, dificilmente matar o trabalho do carro, e sim deixá-lo parecendo que o motor está desregulado. No caso do Dojão os componentes são importados e relativamente novos, então já praticamente elimina a possibilidade de problemas, PORÉM, não custa nada tomar certos cuidados, os quais descreverei a seguir e no final do texto.

Aterramento: certifique-se sempre de que todos os componentes do seu carro estão devidamente aterrados. Claro que essa é uma dica mais para quem tem carro antigo, mas carros novos também podem ter este problema. Digo isso porque a ignição eletrônica do Magnum nos pregou uma baita peça, e que demorou um bom tempo até ser solucionada. Como disse no post passado, em carro velho uma coisa puxa a outra, e é bem difícil um defeito aparecer sozinho. Um dia andando no carro com meu pai estávamos para voltar com ele para casa quando o carro apaga do nada. Igual um apagão de eletricidade, sem avisar. Ficamos boas horas parados, chamamos mecânicos conhecidos e o carro não pegava.

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Depois de especularem sobre os problemas o mecânico resolveu ligar o carro direto da bateria, sem passar pelo motor de arranque. Pegou, ótimo. Ligou bacana, sereno. Andou 100 metros e começou a ficar sem força. Fomos nos arrastando até em casa. Já imaginávamos que era um problema elétrico, por isso foi trocado o regulador de voltagem (que não tinha nada a ver) e o distribuidor (idem). Medimos diversas vezes a ignição com o multímetro comparando com os dados do manual e estava tudo certo, até que meu pai foi medir o aterramento da ignição em um lugar diferente do que costumava medir. Bingo, a ignição não estava aterrada. Por incrível que pareça não foi nossa culpa.

Ela é de metal, porém é pintada e envernizada. A porcaria do verniz fazia praticamente um isolamento da ignição com a chapa do carro e pinos de fixação. Foi só lixar os lugares de contato dela com a chapa do carro e acabou o problema, então lembrem-se: componentes elétricos devem sempre estar bem aterrados e com as conexões perfeitamente encaixadas.

 

Suspensão e freios

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A suspensão dos Dodge consiste de balanças com barra de torção na frente e feixe de molas atrás. É uma boa suspensão, robusta e que dá até certa segurança na hora de sentar a bota no V8, pois ela é meio dura, o que dá uma sensação de segurança um pouco maior do que esperamos em um carro desse tamanho correndo. Agora não dá para ser afobado neste carro, a traseira é muito leve e se não dosar bem o pé ela vai querer passar a frente. No caso do nosso carro a suspensão segue os padrões originais, com amortecedores a gás da Monroe e buchas de poliuretano.

Chegamos a comprar de uma empresa o jogo completo de buchas da suspensão dele em PU, mas várias vieram em medidas erradas, ou não entrariam no lugar ou sobrariam pra fora. Meu pai e eu medimos as sedes de todos os componentes para enviar a empresa e pedir que retificassem as buchas, e a partir daí fabricassem no tamanho exato para colocar no carro, plug and play. Uma coisa legal dele é que não é preciso levantar o carro ou mesmo tirar as rodas para trocar os amortecedores, além de serem os mesmos da Kombi atrás, e acho que os de F-1000 servem na frente.

Com relação aos freios ele possui um sistema de hidrovácuo, e freios a disco na frente e tambor atrás. Ele freia bem, dentro do possível para um carro de quase 1.700 kg. Já passamos (novamente) por mais causos com mecânicos que mexeram nele. No caso dos freios foi pedido para o cara simplesmente colocar lonas novas no freio traseiro. No processo ele conseguiu quebrar um dos estojos que prendem a roda – que nos Dodge são rosca esquerda do lado esquerdo, ou seja, você aperta ao contrário do que está acostumado – e ainda por cima não conseguiu regular a abertura das sapatas. Meu pai saiu de lá mais sem freio do que quando chegou.

Se seu carro antigo tem algum tipo de vazamento de graxa pelas rodas dê um jeito de parar o carro para arrumar o mais rápido possível. No nosso caso ele sempre dava um pequeno vazamento pela roda dianteira direita, dando uma sujadinha no aro, aí meu pai ia lá e limpava com pano. Um belo dia estávamos passeando com o carro quando ele deu como se fosse um freiada apenas na roda direita, de leve. Olhei para o meu pai e três segundos depois a roda travou, cantou pneu, o carro deu uma boa balançada e quando voltou a andar normal começou uma barulheira de metal com metal horrível, tipo trituração. Paramos o carro por duas vezes e eu não consegui ver nada, mesmo com capô aberto. Na terceira vez que paramos estava começando a sair fumaça da roda, e notei limalhas de ferro acumuladas por dentro do aro.

Chamamos o guincho e o levamos pra casa. Ao tirar a roda vimos o estrago. O rolamento interno havia estourado, sendo que virou praticamente poeira, e com a falta dele a roda perdeu o prumo, ficando com uma cambagem negativa tal que a borda do aro pelo lado de dentro começou a roçar na balança superior, e a pinça de freio ficou forçada contra o disco, fazendo altos ralados e sulcos nele, além de praticamente tornear a manga de eixo. Com a roda fora aproveitamos para dar um jeito nas balanças, buchas, pivôs e tal, além de trocar rolamentos, dar um passe nos discos, fazer sangria, pintar os protetores de disco, recuperar a manga de eixo e comprar discos novos. Depois foi só colocar tudo no lugar e botar na estrada de novo.

 

Motor

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Ah o motor… a cereja do bolo. Deixei para o final a melhor (ou pior) parte. Esse motor é um legítimo V8 americano de bloco e cabeçotes de ferro fundido, comando no bloco, tuchos hidráulicos e balancins acionados por varetas. Concepção de 60 anos, porém robusto e confiável como todo V8 deve ser. Se cuidado devidamente, você morre sem precisar abrir. Ele é tão ignorante que uma vez vindo do Rio a bomba de combustível rompeu o diafragma, algo que na maioria dos carros faria o mesmo parar, mas ele continuou andando, com a gasolina sendo puxada do tanque apenas pelo vácuo do motor. Foi a única vez que eu vi o ponteiro de temperatura passar do meio, além dele não consegui passar de 80 km/h no plano e subir igual caminhão velho a serra. Mas não foi o nosso caso, como disse no primeiro texto.

Como o óleo lubrificante vai perdendo suas propriedades com o tempo, e no nosso ele não era trocado, apenas completado, com o tempo ele não fazia mais seu trabalho devidamente. O resultado foram cilindros onde dava para sentir com a unha o tanto que os anéis desgastaram as camisas. A retífica do bloco foi feita em 2004. Acho que está faltando alguma coisa. Ah é, algum erro de mecânico. Nesse caso, o dono da retífica, que na hora de encamisar os cilindros, colocou a especificação da Cherokee 4.7l. Na hora de montar os pistões não entravam. Que legal né?

Volta o bloco para a retífica para colocar no tamanho certo as camisas dos cilindros. Bom, com tudo certo os mecânicos montaram o motor e tal, mas como disse, os outros problemas do carro, como carburador, elétrica e outros impediram do carro andar bem por muitos anos. Com esses problemas sendo eliminados um a um começamos a andar de novo pouco tempo atrás.

Um belo dia meu pai estava embaixo do carro vendo alguma coisa quando caiu um pingo na cabeça dele, o fazendo notar na emenda do cabeçote com o bloco um filete de água e um pouco de ferrugem. No mínimo estranho, então analisando melhor chegamos à conclusão: Se essa água está saindo, ela também pode estar entrando. Iríamos ter que abrir a parte de cima. Para isso seria necessário remover carburador, coletor de admissão, distribuidor… que trabalheira!

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Fizemos tudo isso e constatamos o quê? Advinhem. Que o mecânico havia montado errado os cabeçotes! Primeiro, cada parafuso apresentava um torque diferente, alguns até frouxos, e depois, ele não se tocou que as duas juntas que vem no jogo eram idênticas, ou seja, serviam no mesmo lado. Ele apenas virou a junta para que ela encaixasse nos pinos “à prova de burro”. Isso fez com que alguns furos do sistema de arrefecimento ficassem tapados pela junta, enquanto em outros lugares no furo da junta só aparecia o bloco embaixo, ou seja, a refrigeração do cabeçote estava bem deficiente, sem circulação adequada.

Retificamos o cabeçote para tirar qualquer empeno causado pelo calor, esmerilhamos as vávulas e acabamos resolvendo pintar o coletor de admissão, tampas de válvulas e cabeçotes com uma tinta decente, pois o mesmo mecânico, quando montou o motor, o pintou com tinta de tecido, bem apropriado para aguentar o calor que ele faz né? Depois disso remontamos tudo sabendo que o serviço que fizemos foi mais esmerado do que 99% das oficinas que encontramos por aí.

Hoje em dia, graças a muito esforço, carro está andando maravilhosamente, e acho que é hora de encerrar esse post. Espero que tenham gostado de saber um pouco das histórias do nosso carro. No próximo post darei mais algumas dicas e me despedirei do PC formalmente. Grande abraço a todos.

 

Curiosidade

Apesar de o Magnum contar com o câmbio de quatro marchas no assoalho, ele anda a mesma coisa que o de três marchas. Como? É possível ver no manual que a relação das últimas marchas dos dois câmbios é igual e direta (1,00). O que fizeram foi inserir uma nova engrenagem entre a 2ª e 3ª no câmbio de três marchas e colocar uma relação intermediária nelas. Se ele realmente tivesse uma 4ª marcha mais longa, os 220 km/h viriam bem fáceis, e Mavericks e Opalas chorariam ainda mais (brincadeira, pessoal!)

 

Dicas para carros antigos e Dodges

– Condensadores: Se o seu carro têm, dê um jeito de eliminá-los. Eles praticamente não servem para nada, sendo simples supressores de estática e ruído em carros antigos, porém podem dar muita dor de cabeça e afetar o funcionamento de outros componentes elétricos, até fazê-los estragar.

– Bomba de gasolina: Muitos vendedores e outros lojistas vendem a bomba de gasolina do Maverick como opção na hora de trocar a sua. Saia fora delas, pois a bomba do Maverick apresenta uma pressão de trabalho maior que a suportada pela bóia do Dodge, e apesar de encaixar perfeitamente no lugar da original, faz o carburador trabalhar no limite, tornando muito mais fácil o carro afogar e transbordar gasolina. Esse problema nos perseguiu por muitos anos, só depois de muita pesquisa que descobrimos isso, então, se for trocar sua bomba de gasolina, tenha certeza de que ela é compatível com seu sistema de alimentação.

– Gasolina Aditivada: Se seu carro fica muito parado, evite abatecer com gasolina aditivada, pois a mesma quando fica muito tempo em repouso cria uma goma ou cola, que acaba por entupir os dutos que trazem combustível do tanque. Aconteceu conosco e foi preciso retirar o tanque e o tecalon para desentupir.

Na empolgação e correria para escrever o primeiro texto acabei deixando os modos em casa e me esqueci de prestar os devidos agradecimentos. Gostaria de agradecer à equipe do Flatout por proporcionar esta experiência incrível de troca de informações e conhecimento, tornando este espaço uma extensão de nossas casas e um lugar onde encontramos ou fazemos amigos que compartilham da mesma paixão. Reafirmo o diferencial deste site a nível mundial, pois nunca vi engajamento parecido em nenhum outro lugar. Obrigado à galera que votou e apoiou este PC e em especial ao meu pai por ter feito crescer em mim este amor incondicional, pois este carro é como se fosse a primeira pedra (e que pedra) de um alicerce sobre o qual foi construída toda essa paixão, este interesse em aprender, em cuidar e curtir estas máquinas incríveis. Obrigado a vocês e até o próximo post!

Por Rodolfo Schmidt, Project Cars #166

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