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Chrysler Valiant Charger: o Mopar australiano com motor Hemi que você não conhecia

Muito se fala no mundo paralelo dos muscle cars australianos. Mais especificamente, o Ford Falcon e o Holden Monaro, que eram cupês esportivos com motor V8 e foram, com o passar dos anos, evoluindo até se tornarem dois dos sedãs mais desejados pelos entusiastas. Isto sem falar nas picapes derivadas deles — as emblemáticas Utes.

Acontece que o Falcon e o Monaro não são os únicos muscle cars endêmicos da terra dos cangurus. Há outro, bem menos conhecido, ainda que seu nome seja para lá de familiar. Seu nome é Charger, mas não é o Charger que você conhece. Ele tem motor Hemi, mas também não é o Hemi que você conhece. E, infelizmente, ele não durou tanto tempo quanto seus rivais mais famosos. Hoje, vamos conhecer a história do Chrysler Valiant Charger.

Sendo 100% honestos, a verdade é que o Valiant Charger era a versão fastback de duas portas do sedã Chrysler Valiant. Este, por sua vez, era fabricado pela Chrysler australiana desde 1962. Como que para deixar as coisas ainda mais confusas par nós, tratava-se e uma versão rebatizada do Plymouth Valiant, que era vendido nos EUA desde 1960. Na Austrália, a produção seguia o regime CKD — as peças eram fabricadas nos EUA e enviadas para a Austrália, onde os carros eram montados.

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Apesar do visual meio careta, o Chrysler Valiant tinha como maior destaque seu motor slant-6 (um seis-em-linha montado de forma inclinada no cofre) de 225 pol³ — ou 3,7 litros — e 145 cv. Para se ter uma ideia, isto era bem mais do que os 90 cv do Ford Falcon. E quase o dobro dos 75 cv do Holden Commodore da época.

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O sucesso do Valiant na Austrália nos deixa com uma impressão ainda maior de que ele tinha tudo para se tornar o terceiro medalhão dos muscle cars australianos. Tanto que, em 1963, o carro passou a ser totalmente fabricado na Austrália. Apenas as portas, para-brisa e para-lamas dianteiros eram iguais aos do modelo americano — todo o resto era novo. Em 1965, pela primeira vez, o Valiant era equipado com um motor V8. Era como um muscle car nascendo aos poucos.

A segunda geração, denominada “VE”, foi lançada em 1967. Tratava-se de uma reformulação total, e o Valiant começou a ficar parecido com os carros americanos da época — olhando rapidamente, até dá para confundi-lo com um Dart. Detalhe: uma versão picape foi vendida na Austrália como Dodge Utility. Como dá para ver, o parentesco não é muito distante.

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Como já comentamos algumas vezes aqui no FlatOut, naqueles tempos as fabricantes de automóveis costumavam promover atualizações quase que anualmente em seus modelos. Com o Chrysler Valiant não foi exceção: entre 1968 e 1970, o sedã passou por duas reestilizações antes da chegada da terceira geração, batizada como “VH”, em 1971.

O Valiant ficou ainda maior e assumidamente inspirado nos Mopar americanos — basta olhar para a silhueta do sedã e para a grade recuada, como no clássico Charger americano (ainda que os faróis quadrados destoassem um pouco do conjunto, como acontecia nos também curiosos Dodge argentinos).

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A maior novidade, porém era a chegada da versão cupê, apresentada simultaneamente. De entre-eixos mais curto e carroceria fastback, foi espertamente batizado como Valiant Charger. E, como seu xará americano, ele era um legítimo muscle car — ainda que, entre as várias opções de motor, apenas uma delas fosse um V8.

O modelo básico, chamado apenas de “Charger”, era movido por um seis-em-linha de 3,5 litros e 140 cv. Logo acima dele estava o Charger XL, que tinha motor de quatro litros e 160 cv. Em ambos os casos, o câmbio era manual de três marchas. O modelo intermediário era o Charger 770, cujo motor V8 da família LA — o mesmo que equipava os Dodge nacionais, vale observar — podia deslocar 318 pol³ (5,2 litros) e entregar 230 cv, ou 340 pol³ (5,6 litros) e entregar 275 cv. As duas versões eram acopladas a uma caixa automática de três marchas.

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Curiosamente, a versão mais potente — o Charger R/T — era movida por um seis-em-linha. Mas não era qualquer seis-em-linha: o motor de 4,3 litros era alimentado por três carburadores Weber 45 DCOE de corpo duplo (o famoso Six Pack) e tinha câmaras de combustão hemisféricas. Bloco, virabrequim, bielas e pistões eram reforçados; e a taxa de compressão era de 10:1 (contra 9,7:1 nas versões mais mansas). Com isto, o chamado Hemi-Six entregava nada menos que 302 cv (brutos) a 5.600 rpm, com torque de 44,2 mkgf de a 4.100 rpm.

Com câmbio manual de quatro marchas, era o bastante para chegar aos 100 km/h em apenas 6,1 segundos, e completar o quarto-de-milha (402 metros) em 14,4 segundos.

Não foi à toa, portanto, que o Valiant Charger tornou-se um grande sucesso rapidamente. Mais rara, a versão R/T tornou-se cult entre os entusiastas. No entanto, a raridade não é o único motivo: foi com o Charger R/T que a Chrysler se inscreveu no Campeonato Australiano de Turismo, com o intuito principal de vencer as 500 Milhas de Bathurst de 1971 e 1972.

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De acordo com um dos pilotos da equipe de fábrica, Leo Geoghegan, o Valiant Charger era mais do que capaz de acompanhar os muscle cars V8 da Ford e da Holden nas pistas — especialmente graças ao peso reduzido do motor, o que melhorava a distribuição de massas do carro. Na prática, porém, o Charger não conseguiu resultados muito expressivos na Austrália.

Mas que roncava bonito o seis-em-linha, isso roncava

Em corridas realizadas na Nova Zelândia, porém, o Mopar foi praticamente invencível e tornou-se um herói local. Diz-se que, além do bom desempenho, um dos diferenciais do Charger era sua confiabilidade, e que não era raro ver os rivais sofrendo com problemas mecânicos na pista, enquanto os Mopar seguiam firmes e fortes.

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Apesar disso, o desempenho aquém do esperado no Australiano de Turismo fez com que a Chrysler decidisse, aos poucos, abrandar o apelo esportivo do Valiant Charger. Para começar, além de um visual menos agressivo, com faróis circulares uma nova grade, o Charger perdeu a versão R/T — ainda que seu seis-em-linha Six-Pack continuasse a ser oferecido, como opcional.

A cada ano que entrava, o Charger ficava com visual mais sóbrio. Foi assim até 1978, quando saiu de linha: àquela altura, ainda que fosse praticamente o mesmo mecanicamente, o Charger agora tinha uma grande grade cromada e quatro faróis circulares. Decalques e emblemas especiais na carroceria, que eram presentes no R/T, tornaram-se apenas lembranças. E talvez por isso o Chrysler Charger seja tão pouco lembrado, mesmo que tenha sido um dos maiores sucessos da fabricante ao longo do período de sete anos em que foi produzido.

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