FlatOut!
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Este Porsche tem um motor V6 turbo de Fórmula 1 no lugar do flat-6 – e é simplesmente insano

Nem todo mundo lembra disso o tempo todo, mas a Porsche já forneceu motores para a Fórmula 1. E não foi para qualquer equipe — quem usava os motores Porsche era ninguém menos que a McLaren que, na época, teve parte de seu controle acionário comprado pela TAG — Technologies d’Avant Garde, empresa que presta serviços de gestão para companhias aéreas .

Mas se você acha que isto significa que a Porsche colocava seus icônicos motores flat-6 nos carros de Fórmula 1, saiba que, infelizmente, isto não aconteceu. A equipe mais próxima de usar um boxer na Fórmula 1 foi a Subaru, com um motor de 12 cilindros que foi um fracasso, sobre o qual você pode ler aqui.

Há um bom motivo para que os boxer Porsche não tenham sido usados na F1: largos demais, eles exigiriam que os carros fossem redesenhados com prejuízo à aerodinâmica. Além disso, os V6 turbo eram a norma na época — motores compactos, leves e giradores, capazes de render mais de 1.000 cv em acerto de classificação.

Mas antes, você deve saber que a Porsche não era exatamente novata na Fórmula 1 — já na década de 1920, Ferdinand Porsche ajudou a projetar as Flechas de Prata da Mercedes-Benz e da Auto Union, companhia que, anos mais tarde, daria origem à Audi (dá para ver que é tudo entrelaçado, não?). Depois, na década de 1960, o monoposto Porsche 804, movido por um flat-8 — sim, um boxer de oito cilindros! — de 1,5 litro e cerca de 180 cv.

804

Com o 804, a Porsche conseguiu suas duas únicas vitórias na F1 como construtora: no GP da França e no GP de Solitude, na Alemanha (esta, nem parte do campeonato fazia), ambas com Dan Gurney ao volante. Depois disso, a Porsche abandonou a Fórmula 1 em virtude do alto custo da categoria, mas também disse que não tinha interesse em uma categoria tão distante dos carros de rua.

Nada disso impediu que, exatamente 21 anos depois, a Porsche voltasse à maior categoria do automobilismo mundial. Não foi um movimento muito planejado — aconteceu quando a TAG ainda patrocinava a Williams, que estava em uma bela fase no início dos anos 80, com dois títulos de construtores em 1980 e 1981, e Keke Rosberg sagrando-se campeão em 1982.

Em 1983, Ron Dennis marcou uma reunião com o chefe da TAG, Mansour Ojjeh, e ofereceu-lhe uma parceria que, além de tornar sua empresa a patrocinadora titular da McLaren (como era na Williams, que afinal se chamava TAG-Williams na época), ainda lhe cederia parte das ações. Ojjeh aceitou sem pestanejar e naquele ano, ainda como patrocinador da Williams, bancou o desenvolvimento de um novo motor para os monopostos da McLaren. Não é preciso dizer que a parceria com a Williams acabou depois dessa, não é?

A empresa contratada, como você já deve ter deduzido, foi a Porsche. E, como já falamos, um boxer não serviria para a Fórmula 1, e por isso foi estabelecido que o novo motor seria um V6 com 90° entre os cilindros.

TAGTurboEnginePorsche01

Foi um motor um tanto trabalhoso de se projetar. O primeiro carro a usar o motor em testes, ainda no fim da temporada de 1983, foi uma versão bastente modificada do MP4/1, que usava um V8 Cosworth de aspiração natural. John Barnard, o projetista, teve que adaptar tudo, e o motor ainda não estava totalmente pronto — mas Niki dda queria testar o carro logo e por isso e por isso ficou apressando as coisas. No fim, o MP4/1E era mais uma mula de testes do que um bólido de Fórmula 1 feito para competir. Isto, somado ao fato de que o próprio motor ainda não estava 100%, acabou não vencendo nada.

A glória viria a partir de 1984. Como todos sabem, Niki Lauda acabou vencendo o campeonato e a McLaren-TAG ficou com o título de construtores. No ano seguinte, a mesma coisa — desta vez, com Prost no lugar de Lauda. Em 1986, ainda que McLaren tenha perdido o título para a Williams, Prost conquistou seu segundo título em sequência pela McLaren.

Isto é impressionante porque o motor TAG-Porsche não era dos mais potentes do grid mas, por outro lado, o caía como uma luva no carro projetado especialmente para ele, o MP4/2. Na verdade, a combinação era tão boa que o conjunto, que em seu auge entregava 850 cv, foi usado até 1986 sem grandes alterações. E pensar que a Porsche teve medo de estampar os motores com os dizeres “Made by Porsche” por medo de a empreitada ser um fracasso e prejudicar as vendas dos carros da companhia.

Acontece que o fruto mais impressionante desta época — que durou até 1988, quando a McLaren trouxe Ayrton Senna da Lotus e firmou uma parceria ainda mais vitoriosa com a Honda — não é o carro de Fórmula 1. É algo ainda mais bacana, que passa a maior parte do tempo guardado no centro de desenvolvimento tecnológico da McLaren em Woking, Reino Unido: um 911 equipado com o V6 desenvolvido pela Porsche para a equipe britânica de Fórmula 1.

De acordo com um artigo no site Drive Cultque foi tirado do ar e só pode ser visualizado pelo Internet Archive — a existência deste carro era considerada apenas um boato até 2012, quando o Centro Tecnológico da McLaren abriu as portas para uma visita especial.

911-f1 (1)

Com carroceria impecavelmente branca, o carro parece só um Porsche 930 dos anos 80 em condição impecável, mas é um verdadeiro monstro. Martin Spain, o autor do artigo, clicou algumas fotos do carro (mesmo sem permissão dos guias) e, talvez sem saber, criou para sempre um dos únicos (provavelmente os únicos, mesmo) registros visuais da existência deste carro.

Por fora, denunciam sua natureza insana um jogo de rodas Ruf de cinco raios (sim, aquela Ruf) e a placa que diz “TAG turbo”. Por dentro, um botão de partida verde no console central (não há imagens do interior) e, no cofre, um par de enormes intercoolers esconde a pequena maravilha de 1,5 litro e algo entre 700 e 850 cv — que podem fazer deste um dos Porsche 911 mais rápidos do planeta, ainda que não haja qualquer menção ao desempenho do carro.

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Numa boa: não é o motor que tem dois intercoolers — são os dois intercoolers que têm um motor!

É provável que este carro tenha sido feito pela Porsche para testar o motor, mas como ele foi desenvolvido em uma época distante das câmeras portáteis e drones e youtubes e facebooks, sua história permanece secreta até hoje. Aparentemente ele jamais deixou o depósito da McLaren em Woking — e provavelmente não o fará tão cedo. O que é realmente uma pena.