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História

Pontiac GTO: os 50 anos do primeiro muscle car

O ano de 2014 marca o aniversário de 50 anos um símbolo da cultura automotiva americana: o Ford Mustang. O que nem todo mundo lembra é que outro clássico também completaria meio século de vida se ainda estivesse entre nós: o Pontiac GTO. 

Em 1963 a General Motors divulgou um comunicado entre todas as suas divisões: a companhia deixaria de investir em equipes de fábrica no automobilismo. Isso era uma péssima notícia para a Pontiac, que começava a despontar como a divisão de alto desempenho do grupo, graças ao sucesso de seus carros nas pistas de arrancada, e a cair no gosto dos jovens por causa de seu estilo esportivo, com bitolas mais largas e postura agressiva.

Foi justamente o público jovem quem ajudou a Pontiac a alcançar o terceiro lugar em vendas nos EUA, e o fim da Pontiac nas dragstrips poderia fazê-los perder o interesse pela marca. Era imprescindível que se encontrasse uma alternativa. Esta alternativa foi o GTO.

Quem é o pai?

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Há muita discussão a respeito de quem foi o “pai” do Pontiac GTO. Há quem diga que foi Jim Wangers, do departamento de marketing, por convencer os executivos da marca de que os jovens eram o mercado mais importante. Outros dizem que foi um trio de engenheiros —Russell Gee, Bill Collins e John DeLorean, que era o engenheiro-chefe da marca na época, que pensarem “e daí que não podemos correr? Vamos colocar a força das pistas nas ruas!”

Só uma máquina do tempo poderia nos a verdade, mas sejamos francos: não faz sentido escolher entre uma versão ou outra da história. O que importa é que estes quatro homens simplesmente inventaram o conceito de muscle car como o conhecemos hoje.

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O conceito é maravilhosamente óbvio: colocar um dos maiores e mais potentes motores, que equipavam seus modelos full-size em seu modelo médio (para os padrões americanos, que chamam o Dodge Dart de “carro compacto”) que estava prestes a ser lançado: o Tempest. Por sorte, os motores da Pontiac na época eram todos idênticos nas dimensões, independentemente do deslocamento. Sendo assim, o V8 389 (6,4) do Pontiac Grand Prix coube no cofre do Tempest, no lugar do V8 326 (5,3) usado originalmente.

Na surdina

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Naqueles tempos, a rivalidade entre as fabricantes americanas não estava restrita apenas às três grandes de Detroit. A indústria automotiva estava crescendo tanto que até mesmo marcas pertencentes a uma mesma companhia eram concorrentes ferozes entre si — e quem ganhava com isso era o consumidor. A Pontiac não queria entregar seu plano de bandeja para as outras divisões da GM, e por isso não fez muito alarde ao lançar seu Tempest com motor 389. Sendo assim, em vez de anunciá-lo como uma nova versão, a marca foi discreta e o lançou como um pacote opcional.

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Disponível para as versões conversível, hardtop e cupê, o pacote foi batizado de GTO, inspirado na Ferrari 250 GTO. Não houve complicações quanto a direitos sobre o nome porque a sigla para Gran Turismo Omologato era de propriedade da FIA, não da Ferrari. O motor de 6,4 litros do Tempest GTO tinha 325 cv brutos a 4.800 rpm quando equipado com carburador quádruplo Carter, e de 348 cv quando se optava pela carburação Tri-Power opcional (três carburadores Rochester 2G de corpo duplo). A transmissão era manual de três marchas com alavanca no assoalho e manopla Hurst, embora fossem opcionais um câmbio manual de quatro marchas e a transmissão automática de duas marchas Super Turbine 300.

Equipamentos adicionais incluíam mangueiras de metal para as linhas de freio, diferencial de deslizamento limitado e sistema de arrefecimento de alta capacidade. Curiosamente, o conta-giros também era opcional.

Sucesso esperado

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Mesmo sem fazer muito barulho no lançamento, o pacote GTO não demorou a se popularizar entre o público jovem — esgotando as 5.000 unidades enviadas para as concessionárias de todo o país. Parte disso se deve à atenção que, mesmo com a discrição da Pontiac, a mídia deu ao carro. Testes da época indicavam belos números: 0 a 100 km/h em 6,6 segundos e quarto-de-milha (um dado importante, visto que as arrancadas ainda eram importantes para a imagem destes carros) em 14,8 segundos. O ponto alto foi o comparativo que a revista Car and Driver fez na época, colocando o Pontiac GTO lado a lado com a Ferrari que lhe emprestou o nome.

Foi por causa de toda esta recepção positiva que ainda naquele ano as outras divisões da GM começaram a trabalhar em projetos semelhantes, bem como as companhias rivais de Detroit. Nomes como Chevrolet Chevelle e Dodge Dart começaram a aparecer.

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Em 1965 o Tempest foi atualizado e, com ele o GTO. O visual adotou os faróis empilhados na vertical que são a forma mais conhecida do GTO (e que lembra bastante o nosso Ford Galaxie 1967). O comprimento aumentou em 7,9 cm, mas o entre-eixos e o espaço interno permaneceram os mesmos. Acompanhando o novo visual vieram mudanças no motor: agora, o de carburador quádruplo rendia 335 cv, graças ao comando mais bravo e ao novo coletor de admissão. O Tri-Power agora tinha 360 cv, e e chegava aos 100 km/h em 6,1 segundo.

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No ano seguinte, o GTO se tornaria um modelo próprio, mas as maiores mudanças estavam reservadas para 1967: o motor passava a deslocar 400 pol³, ou 6,5 litros. A ideia era contornar uma limitação imposta pela GM, que eliminou a opção de três carburadores, e manter a potência de 360 cv. Mas havia um problema: a mobilização da concorrência acabou acelerando o processo de envelhecimento do GTO, que tinha apenas três anos de vida. Por isso a Pontiac decidiu mudá-lo radicalmente para o ano seguinte.

O juiz

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Em 1968, o Tempest mudou de plataforma e, consequentemente, o GTO também. Se há quem prefira a primeira geração, também existem os admiradores fiéis da segunda. Não é preciso explicar demais: a nova plataforma A da GM deu ao GTO um entre-eixos mais curto e uma carroceria mais musculosa e curvilínea, ótimo exemplo do perfil “garrafa de Coca-Cola”. A dianteira em material plástico emborrachado, que embutia o para-choque e, por um custo adicional, escondia os faróis atrás da grade, era extremamente atraente.

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Mecanicamente, porém, o carro era o mesmo — só o modelo básico tinha 15 cv a menos, totalizando 320 cv. Contudo, não demorou para o motor Ram-Air II fosse introduzido como opcional. Ao ser equipado com ele, o motor de 400 pol³ alcançava os 370 cv, tornando o novo carro o mais potente GTO até então — vale lembrar que a Pontiac declarava números de potência bem próximos do que era entregue nas rodas, diferentemente dos concorrentes, que preferiam divulgar a potência bruta, em uma estratégia para ter vantagem em competições da NHRA, que separavam os carros pela cavalaria.

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Acontece que, naquele ano, a Plymouth lançou o Roadrunner, seguindo uma estratégia interessante: entregar um carro muito potente, porém apenas com os equipamentos básicos, por um preço camarada. Vendo potencial naquilo, a Pontiac preparou aquele que talvez seja seu maior ícone dos american muscle: o Pontiac GTO “The Judge” — nome que vinha de um programa humorístico muito popular na época, o Laugh-In, da NBC. Nele, o comediante Sammy Davis Jr. sempre repetia a frase “Here comes the judge” — ou “aí vem o juiz”.

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De início, a marca queria fazer algo parecido com o Roadrunner e entregar desempenho de baixo custo. Contudo, eles acabaram desistindo da ideia, e decidiram transformar o Judge em uma versão mais potente, sim, mas também mais cara. O pacote Judge consistia no sistema Ram-Air III, com entradas de ar maiores, um aerofólio, adesivos e faixas temáticos e a opção pelo belo tom de laranja que, na verdade, se chamava “Carousel Red”. O GTO “The Judge” podia ser um hardtop ou conversível, e respondeu por quase 7.000 das 72 mil unidades do GTO vendidas em 1969 — o melhor desempenho na carreira do muscle.

Declínio

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Para o ano seguinte, o GTO (e o Judge) recebiam um motor ainda maior: o V8 455 (7,4 litros) e os mesmos 360 cv, porém a baixíssimas 4.300 rpm. O torque era seu maior destaque: 69,1 mkgf a apenas 2.700 rpm. O resultado era que, mesmo maior, o motor era menos poluente, algo importante em um ano em que os órgãos reguladores de emissões começavam a pesar sobre os muscle cars.

Era uma tendência que crescia — afinal, depois do auge sempre vem a queda. O motor era mais manso, e a Pontiac até oferecia um pacote instalado em concessionárias para quem não estivesse satisfeito, consistindo em cabeçotes preparados, comando mais bravo e carburador Holley quádruplo. Mas a imagem do GTO (e dos outros muscles, por extensão) já estava começando a ficar comprometida, e as vendas caíram quase que pela metade.

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A chegada de 1971 só piorou as coisas: a gasolina de baixa octanagem se tornava mais abundante no mercado, e a Pontiac decidiu reduzir a taxa de compressão dos motores. O resultado foi uma queda de força assustadora: agora, o V8 400 entregava 300 cv e 55,3 mkgf, e o 455 ficava com 335 cv e 66,3 mkgf. Péssimo para as vendas, e a reestilização da dianteira não ajudou muito. Era bonita, mas não se comparava à anterior. As vendas refletiram as mudanças ruins, caindo para 10.532 ao fim de 1971, e para ínfimos 5,8 mil no ano seguinte.

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Era um sinal dos tempos: a crise do petróleo transformara os muscle cars em vilões, e os esportivos em piadas sobre rodas. Isso ficou ainda mais evidente 1973 a sigla voltou a representar um pacote opcional, desta vez para o Pontiac Le Mans. Com um visual mais careta — tendência da época, que também pode ser observada no desastroso Mustang II, o carro tinha apenas câmbio automático de três marchas. Seu V8 de 455 pol³ foi duramente estrangulado, e agora entregava apenas 230 cv (líquidos, como ditavam as novas normas da SAE).

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O sopro de alívio veio em 1974, com uma nova mudança: agora um pacote do Pontiac Ventura, que era um compacto para os padrões americanos, e disponível em versões hatch e cupê, o GTO se tornou um concorrente do Ford Maverick e do AMC Hornet X, com motor V8 350 de 200 cv — carro pequeno e motor grande, como havia sido há 10 anos. As vendas cresceram novamente, com o GTO emplacando 7.058 unidades, mas já era tarde: a Pontiac aposentou de vez o GTO.

Uma breve ressurreição

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Exatamente 30 anos depois, os americanos receberam um presente lá da Austrália: um Holden Monaro rebatizado, com volante do lado esquerdo, carroceria cupê e adereços aerodinâmicos. Mas o melhor era o que havia debaixo do capô: um V8 small block Chevrolet de 5,7 litros, o LS1, de 354 cv, que podia até vir com câmbio manual de seis marchas. Ele poderia ter sido o muscle car moderno da Pontiac, mas suas vendas ficaram bem abaixo das 18.000 previstas pela GM.

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Parte disso se deveu a seu visual, que foi considerado pouco original, genérico e não-condizente com o desempenho do carro — o público preferiu comprar o Ford Mustang, que acabava de ganhar uma nova geração com estilo retrô, ou o novo Dodge Charger, que também tinha certa inspiração nos carros do passado. A Pontiac sofreu por remar contra a maré, e nem mesmo a adoção do V8 LS2 de seis litros e 405 cv foi suficiente para mantê-lo no mercado. De qualquer forma, a Pontiac foi uma das marcas extintas em meio à crise econômica que abalou o mundo em 2009.

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Os muscle cars retrô, porém, resistiram — a Chevrolet lançou seu Camaro em 2010, e a Dodge também tomou providências, apresentando o Challenger atualizando o Charger. Talvez, se a Pontiac tivesse resistido, os americanos tivessem aprendido a valorizar o GTO e, quem sabe, estaríamos lendo notícias sobre ele até hoje.