FlatOut!
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Car Culture WTF? Zero a 300

Por que alguém colocaria seu supercarro para fazer off road?

Jeep Wrangler, Land Rover Defender, Mercedes-Benz G-Wagen, Toyota Land Cruiser e congêneres foram feitos para atravessar terrenos difíceis longe do asfalto. Eles são veículos robustos e simples, com chassi do tipo escada, carroceria quadrada, interior espartano e diversas características importantes para superar obstáculos. Um bom offroader precisa ter diversas características que vão bem além da suspensão elevada e da tração integral.

A suspensão também precisa ter bom curso (tanto de compressão quanto de extensão); pneus de perfil alto que sejam pelo menos mistos (idealmente, do tipo mud, ou “lameiros” como se chama por aqui); diferencial com autoblocante pelo menos em um dos eixos; diferencial central e, se possível, reduzida. Além, é claro, de ângulos de ataque, transposição e saída generosos.

É possível encará-los como o extremo oposto dos superesportivos, que são baixos, sofisticados, caríssimos, raros (ao menos alguns deles) e têm no asfalto seu habitat natural – na verdade, quanto mais asfalto, melhor eles podem demonstrar sua capacidade. Para começar, eles são aerodinâmicos e, por conta disto, possuem balanço dianteiro bem mais longo (para ajudar no perfil em forma de cunha) e, com isto, seus ângulos de ataque e transposição não estão entre os melhores. A suspensão, além de baixa, tem curso reduzido. A rigidez à torção é alta – algo muito desejável na hora de fazer curvas em alta velocidade, mas nem tanto na hora de torcer a carroceria em uma trilha. E a banda de rodagem dos pneus é praticamente inteiriça: gruda no asfalto quente, mas escorrega quando não há pavimento algum.

Então, da mesma forma que um utilitário especializado em trilhas não se sai muito bem no asfalto (o Mercedes-Benz G-Wagen AMG 6×6 que o diga), um superesportivo definitivamente não se sente à vontade em uma trilha, um atoleiro ou mesmo uma estrada não-pavimentada. Ainda assim, por alguma razão o dono deste McLaren 720 S decidiu colocá-lo nesta nesta situação:

Sim… o vídeo foi filmado com o celular na vertical. Regrinha básica, gente: celular sempre na horizontal

Nos parece uma daquelas tentativas de conseguir likes e “viralizar” apelando para algo mais do que improvável – uma atitude desconcertante, quase iconoclasta: raspar para-choques, quebrar rodas, riscar para-lamas com pedras. Tirar um representante do estado da arte da engenharia automotiva de alto desempenho de sua zona de conforto. Pode ser só uma forma de ganhar likes e popularidade meio dolorosa para alguns de nós.

Aos 00:50 é possível ver a roda dianteira direita flutuando no ar, e os ruídos do assoalho raspando sobre as irregularidades do piso chega a doer. Mesmo com a suspensão ativa que utiliza um sistema eletro-hidráulico para alterar a rigidez dos amortecedores, a altura de rodagem e atua até mesmo como um substituto para as barras estabilizadoras, o curso reduzido torna a experiência traumatizante para quem assiste. O cinegrafista até brinca com a situação a certa altura, dizendo “Camel Trophy”, competição off road realizada nas piores estradas da América do Sul nos anos 80 e um verdadeiro teste de resistência para veículos fora-de-estrada de verdade. Mas uma coisa é certa: este pobre supercarro jamais iria querer passar por isto de novo.

Não foi a primeira vez que alguém colocou um McLaren em estradas de terra, porém. Em agosto de 2017 o youtuber Mike Tornabene pegou não um, mas dois exemplares do McLaren 570 GT e foi acampar com eles em um deserto na Califórnia. Os carros não pegaram trilhas pesadas, mas passaram a maior parte do tempo rodando em estradas de chão. Considerando que eles usam pneus 225/35/19 na dianteira e 285/35/20 na traseira, e têm apenas 8,5 cm de vão livre do solo, podemos dizer que são condições bem adversas.

Foi a própria McLaren quem cedeu os dois exemplares do 570 GT para que Mike e seu amigo fossem acampar com eles, dizendo apenas para que eles não destruíssem os dois carros. Aparentemente a fabricante quer mesmo mostrar que o 570 GT aguenta maus tratos.

Agora, existe quem deixe as coisas mais interessantes. Você talvez já tenha visto este clássico vídeo de uma Ferrari 288 GTO fazendo hoonagem em uma propriedade rural no Reino Unido. Foi um dos primeiros virais de Tax the Rich, o misterioso youtuber que não tem pena nenhuma das preciosidades de sua coleção.

A precursora da Ferrari F40, como você deve lembrar, foi criada para o Grupo B. A intenção inicial pode ter até sido colocá-la em provas de turismo e ralis de asfalto, como as 308 da Scuderia Michelotto, mas o Grupo B ficou mesmo famoso por representar a era dourada do Campeonato Mundial de Rali, com protótipos que quase não tinham restrições de potência e configuração mecânica. Então a associação da 288 GTO com os ralis é praticamente automática na mente dos entusiastas. Ela até parece ter sido feita para deslizar sobre o cascalho!

Tax é mestre neste tipo de coisa. Mas o modo como ele apresenta os “passeios” que faz com seus superesportivos e carros de luxo é diferente. Há quem não goste de ver uma GTO, uma Enzo ou um Rolls-Royce deslizando de lado na lama ou na grama, mas por alguma razão é bem mais fácil apreciar seus vídeos. Deve ser porque ele sabe o que faz ao volante de um carro.

Agora, com exceção do senso comum, nada impede ninguém de transformar um superesportivo ou um carro de ultra-luxo em um off roader. Que o diga o criador deste Bentley Continental preparado para trilhas, que recebeu modificações para ficar mais de acordo com a descrição de um fora-de-estrada que demos no início deste texto.

O carro foi modificado pelo programa de TV Supercar Megabuild, da National Geographic. Ele teve os para-lamas cortados, ganho suspensão de curso longo e pneus lameiros e recebeu proteção para o assoalho. E é equipado com um motor W12 de seis litros e pelo menos 560 cv, além de 66,2 mkgf de torque. E foi arrematado no eBay em setembro de 2017 por £ 40,8 mil, o que dá aproximadamente R$ 188 mil em conversão direta.

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Originalmente ele era assim:

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É desconcertante, e para alguns até revoltante, considerando que, definitivamente, o Continental GT não foi feito com off-road em mente. Por outro lado, é o tipo de coisa que chega a ser interessante, de tão inóspita. E parece funcional.

Certas coisas não precisam de um motivo para serem feitas e ninguém tem a obrigação de apreciá-las. Mas por que não fazê-las?