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Project Cars Project Cars #151

Project Cars #151: a história do meu Volkswagen SP2

Olá, FlatOuters! Me chamo Fred Martos, tenho 27 anos, sou advogado e professor universitário, nascido e criado no interiorrrrrrzão de São Paulo, na cidade de Franca, mas vivendo em Sampa nos últimos 5 anos. Pretendo utilizar esse espaço para contar um pouco da minha vida e do processo de restauração dos meus dois VW SP2 (sendo um 1974 e o outro 1975). Então, apertem os cintos e se preparem para conhecer o ProjectCar # 151.

Inicialmente gostaria de agradecer a oportunidade de poder compartilhar a minha jornada e desse carrinho que eu tanto admiro e me esforço para preservar sua história. Quando recebi o sinal positivo para integrar o Project Cars fiquei imensamente feliz e honrado. Prometo me empenhar bastante para partilhar o máximo de informações e causos possíveis com vocês.

 

O surgimento do primeiro esportivo brasileiro da Volkswagen

Considerando que esse é o post inaugural do meu projeto, acho interessante apresentar um pouco da história do VW SP2 para aqueles que ainda não a conhecem.

Em 1967 foi criado o “Puma GT” que abandonou os componentes mecânicos do DKW e passou a utilizar o chassi, motor e suspensão da Volkswagen e uma carroceria feita em fibra de vidro.

Ao verificar a grande aceitação popular e o crescimento vertiginoso nas vendas do Puma GT, a Volkswagen percebeu que poderia explorar um novo nicho junto ao público brasileiro, qual seja: dos pequenos esportivos. Logo, ao constatar que a base do Puma utilizava-se quase que inteiramente de peças VW, restou claro a viabilidade de produzirem seu próprio esportivo, eis que surgiu o “Projeto X”.

O “Projeto X” teve início em 1969. O principal objetivo desde ousado projeto era a criação de um veículo totalmente desenvolvido no Brasil. A aprovação desse projeto somente foi possível em razão do alto prestígio que Rudolf Leiding (então presidente da VW no Brasil) possuía junto à matriz da fábrica na Alemanha. Tanto é que em 1973 ele retornou para a Alemanha para se tornar o CEO da VW matriz.

O projeto eleito para dar forma ao Projeto X foi liderada pelo engenheiro Senor Schiemann e a sua equipe de projetista era composta pelos gênios: Marcio Piancastelli, José Vicente Novita Marins e Jorge Yamashita Oba além de outros membros da VW brasileira.

O projeto foi apresentado ao público em março de 1971, durante a Feira da Indústria Alemã que ocorreu no prédio da Bienal em São Paulo. Entre as atrações do evento destacava-se o protótipo Mercedes C-111 na cor laranja, com motor rotativo e portas “asa-de-gaivota” e no estande da Volkswagen brilhava o protótipo do VW SP1 e do VW SP2. Todavia, somente um ano depois foi dado início na comercialização do veículo.

Conforme se verifica nas fotos, o “modelo de estudo” apresentado foi para comercialização com pouquíssimas alterações de acerto (em especial no escapamento, grade protetora “churrasqueira”, modelo das rodas e encosto de cabeça).

Sobre a origem do nome do carro acho interessante apresentar as duas histórias existentes. A corrente mais aceita informa que o nome do carro seria uma homenagem à cidade de São Paulo, pois foi o estado em que o carro foi projetado e produzido (na fábrica de São Bernardo do Campo). Outro grupo ventila a história de que “SP” seriam as iniciais de “Sport Prototype”. Ambas são coerentes, mas até hoje não vi ninguém afirmar com propriedade qual é a “correta”.

Sobre a montagem do carro, o VW SP2 foi montado em cima do chassi da VW Variant. Contudo, as semelhanças se encerram aqui. Em uma restauração desse carro o máximo que você conseguirá aproveitar da Variant é o assoalho (mesmo assim alterando o local dos trilhos dos bancos) e caixas de ar internas (com pequenas adaptações).

Aproveito para alertar aos interessados em restaurar um VW SP2 que se trata de um carro muito difícil de encontrar peças, existindo pouquíssimas compatibilidades com outros modelos. Então, se for comprar um VW SP2, verifique bem os itens ausentes no carro, isso fará muita diferença no seu bolso caso opte por uma restauração buscando originalidade (peças como lanternas, parachoques, bancos, volante, aro do farol com valores superiores R$ 2.000 cada — é uma triste realidade!).

Nos próximos posts, em que darei maior ênfase ao processo de restauração em si, tentarei compartilhar com todos informações sobre algumas peças que obtive êxito em identificar compatibilidade com outros modelos.

 

Informações técnicas importantes

O VW SP2 usa motor 1.7 (1,678 cm³), dupla carburação (Solex 34 PDSIT), freio a disco dianteiro e desenvolve 75 cv. Seu desenho é arrojado com claro apelo esportivo. O interior é de ótimo gosto, com bancos de assentos longos, apoio de cabeça regulável e acolchoamento na região lombar. O painel é composto por seis relógios (velocímetro, contagiros, amperímetro, marcador de combustível, marcador da temperatura do óleo do motor e relógio de horas) e feito de plástico deformável para o caso de acidentes (representando uma diferença inovadora para e época). Por fim, o painel é arrematado pelo volante esportivo de três raios da marca Walrood.

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Existem diversos detalhes que permitem dizer que o VW SP2 é um carro único! A presença do cinto de três pontos (novidade ao público brasileiro) e tiras na tampa do motor para segurar malas (os raríssimos “Dallanese”) e haste pantográfica do lado do motorista. O carro é equipado com Para-choques de borracha e faixas reflexivas por toda a lateral. Nas portas existe uma luz vermelha de advertência no canto inferior para dar a devida visibilidade e segurança para abrir a porta. Um verdadeiro charme do carro é a luz de mapa que fica no forro de porta do passageiro. Tais pontos eram destaque na propaganda de época do carro, conforme segue:

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Um detalhe que chama a atenção no VW SP2 é a sua altura: o carro tem apenas 1.158 mm de estatura. Na época foi o carro de série mais baixo produzido no Brasil e está entre os mais baixinhos do mundo até os dias atuais.

O apelo esportivo é mantido na sua dirigibilidade. É necessário certo malabarismo para entrar no carro e engana-se quem pensa que “tampinhas” levam vantagem para pilotá-lo. A ergonomia nos bancos com perfil colado no assoalho exige do motorista ficar com as pernas e braços praticamente esticados (lembrando os carros de corrida) e quem tem menos de 1,70m tem um pouco de dificuldades para se acostumar com os pedais.

Apesar de inexistir informação oficial, consegui em conjunto com um amigo que trabalha dentro da Volkswagen a notícia de que foram produzidos 10.122 exemplares do VW SP2, sendo que o Primeiro Chassi tem o número BL-000101, fabricado em 23/06/1972 na cor prata e o último tem o número de Chassi BL-010307, fabricado em 16/12/1975 na cor branca.

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Da totalidade da produção, por meio de exportação oficial foram enviadas 680 unidades para outros países como: Arábia Saudita, Emirados Árabes, Kwait, Zaire, México, Nigéria, Chile e Bolívia.

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Curiosamente, tive a oportunidade de conhecer o chassi nº BL-010303 que pertence ao amigo C.H.B. Trata-se de um VW SP2, Branco Polar, 1976 que está em ótimo estado de conservação. Não é o último exemplar (agora sabemos da existência de mais quatro números maiores), mas estava ali na fila de despedida desse amado carrinho quando foi encerrada sua produção.

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A lenda do Volkswagen SP1

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Ah… aos incrédulos, reforço aqui que o VW SP1 existiu! As vendas não decolaram (foram produzidas 84 unidades), pois o carro apresentava uma versão mais simplificada que não caiu no gosto do público (o motor era 1.6 produzindo 65 cv, possuía somente quatro instrumentos, o painel não tinha a parte que protege o freio de mão e apoio de braço).

E mais: os poucos VW SP1 produzidos foram “transformados” em VW SP2 pelos seus proprietários ao longo dos tempos (o upgrade era fácil e acessível). Atualmente, trata-se de uma verdadeira mosca branca no meio antigomobilista, sendo que eu tenho notícias de somente quatro exemplares em todo Brasil.

 

Eternamente jovem

Um ponto crucial que determinou o encerramento da produção do VW SP2 era seu baixo desempenho para um carro definido como esportivo.

Dirigir o carro é uma delícia, mas a relação coroa pinhão 8×31 (chamada de caixa longa) atuando junto com o motor de 75cv atrapalha na hora de fazer subida. Há recompensa em retas e descidas, mas, infelizmente, o “calcanhar de Aquiles” do VW SP2  está voltado ao seu desempenho.

Assim sendo, o sucesso do VW SP2 que perdura até os dias atuais relaciona-se diretamente com seu desenho arrojado. Pode-se afirmar que suas linhas não envelhecem e se mantêm modernas até a presente data (sendo objeto de admiração e estudo nos principais cursos de design da atualidade)

Foto 18

As linhas harmoniosas desse importante esportivo brasileiro são responsáveis por um veículo de rara beleza. Na ocasião da criação do VW SP2 a renomada revista alemã Hobby anunciou-o como o “Volkswagen mais bonito do mundo”. No mesmo período a revista americana “Car and Driver” conclamou para a matriz alemã da Volkswagen produzi-lo em escala mundial.

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Uma triste notícia é que os norte-americanos ficaram impossibilitados até mesmo de importar o veículo. Na época o carro foi acusado de ter o farol com perfil muito baixo, infringindo as leis de trânsito e rodagem em vigência naquele País…Uma pena!

Contudo, chamo atenção aqui para mais uma lenda: “Dizem” que o saudoso astro do pop Michael Jackson possuía um (ou dois) modelos do VW SP2, mesmo sendo vetada sua importação. Parece que essa história teria sido noticiada em 1998 numa edição especial da “Revista Quatro Rodas”, mas não localizei a veracidade da informação.

 

 

A relação Homem x Máquina

Apresentadas algumas informações históricas e técnicas do modelo, gostaria de tecer alguns comentários sobre o início da minha relação com o VW SP2.

Como a maioria aqui, não sei precisar quando me tornei um Gearhead. No período de gestação da minha mãe andei muito de Fusca e Corcel II e nos primeiros anos de vida cresci dentro de um Marajó e um Passat LSE. Mais que isso, meu pai me contou que quando eu era recém-nascido e aprontava aquele berreirão na madrugada, ele só conseguia me acalmar e me fazer dormir quando me colocava no banco de trás do Corcel II dele e ficava dando voltas no quarteirão durante a madrugada. Logo, acho que sou um Gearhead, desde sempre!

Outra história contada por amigos da família é que minha mãe colocava doses homeopáticas de ferrugem na minha mamadeira, daí o gosto por carros antigos (se alguém chamar de velho a amizade acaba no mesmo momento). Fica aí pra vocês decidirem qual história é mais convincente.

Não me esqueço a primeira vez que vi um VW SP2. Eu tinha 9 anos e eles estava em um ferro velho. O VW SP2 em questão estava com a traseira para a rua, na cor amarelo imperial e estava entre outros vários carros separados da calçada somente por uma tela. Quando eu o vi a primeira vez perguntei rapidamente para meu pai “que carrão era aquele”.

O velho deu aquele sorriso no rosto, fez o retorno na avenida e parou para me apresentá-lo e contar um pouco sobre ele. Como era final de semana, o local estava fechado, mas deu para ver bem os detalhes da traseira e da lateral.

Foi paixão à primeira vista! Passei os outros dias pergunta mais e mais sobre o carro, queria saber da onde tinha surgido aquela super máquina…

Como qualquer criança soltei “Paiiii compra pra mim?”. E ele viu meu entusiasmo e pediu para eu ligar e ver o preço para avaliar a possibilidade.

É claro que ele respondeu isso somente para eu parar de perturbá-lo, até porque nossa casa não tinha espaço para guardá-lo… Mesmo assim liguei lá e falei com o proprietário do ferro velho que com seu jeito turrão me respondeu que queria R$ 300 e que o carro possuía documento.

Naquela época esse carro não era tão valorizado e sua situação estava longe do razoável.

Ao encontrar meu pai no final do dia, passei a notícia para ele e nos dias seguintes eu não falava de outro assunto… Toda hora queria saber se ele já tinha se decidido. Até que duas semanas depois ele falou “Liga lá novamente, se o carro estiver lá irei conversar com o proprietário”.

Ao ligar, a decepção, o carro tinha acabado de ser vendido… Eu sei que as chances de tê-los sempre foram remotas por uma questão lógica de “possibilidade x realidade”, mas marco essa situação como o primeiro VW SP2 que escapou de minhas mãos. Infelizmente esse carro jamais foi visto novamente em Franca/SP.

Nos anos seguintes comecei a procurar na internet fotos e informações sobre o carro. Me lembro que o vizinho do meu Tio comprou um e de vez em quando deixava ele na rua… Eu, molecote de tudo, deixava de brincar com o resto da turma para ficar apreciando o carro

Os anos foram passando e minha vontade de ter o meu VW SP2 só aumentando, e claro sempre sendo apoiado pelo meu pai que pedia para eu esperar que um dia chegaria minha hora. Aliás, gostaria de aproveitar este espaço para registrar minha gratidão pelo apoio incondicional que ele sempre me proporcionou para realizar meus sonhos. Sou muito feliz e grato por tudo. Quanto se tem esse tipo de apoio as coisas ficam mais fáceis!

Quando eu tinha por volta de 12 anos surgiu uma figura importante na minha história, um grande mentor e incentivador da cultura antigomobilista, o Tiago Songa. O Songa é uma figura conhecida no meio, mas a forma que nos encontramos em nada se relaciona com carros. Para quem o conhece, provavelmente não sabe que ele é bacharel em direito, principalmente porque ele conseguiu seu reconhecimento no meio jornalístico. Na época da faculdade de direito, ele foi aluno do meu pai, no mesmo período ele era o Presidente do Clube do Automóvel Antigo de Franca. Certo dia, após a aula, meu pai abordou ele para contar que tinha um filho que era louco por carro antigo… Nessa ocasião o Songa já se prontificou a ajudar no que fosse necessário para estimular meu gosto e tentar realizar meu sonho de ter um VW SP2… Aí o bicho começou a pegar!!!

Agora com o Songa do nosso lado, começamos a procurar um carro “restaurável” porque não tinha grana para comprar um em perfeito estado de conservação.

Desde que traçamos o perfil do carro a procurar, o Songa sempre nos alertou de um VW SP2 branco que tinha em Franca… O carro estava muito bom e o dono não estava disposto a vender, mas caso conseguíssemos negociá-lo seria bem mais fácil do que comprar um carro para fazer (essa história será melhor explicada no POST 2, fiquem atentos!).

O tempo foi passando e dois anos mais tarde o Tiago Songa encontrou um VW SP2 Ocre Marajó (não me recordo o ano) à venda no perfil do que queríamos. O carro estava próximo da minha casa, então peguei minha bicicleta e fui vê-lo o mais rápido possível… Na mesma noite conversei com meu pai e fomos juntos ver o carro na data mais próxima possível. O proprietário pediu R$ 3.500,00; contudo, estávamos em uma época de vacas magras em casa.

Meu pai disse que tentaria arrumar o dinheiro da “entrada” e negociar… Infelizmente as coisas não estavam fáceis e alguns meses depois quando fomos procurar o carro já era tarde demais… Foi a segunda vez que perdi o carro!

Desde então percebi que se quisesse ter um VW SP2 eu teria que juntar dinheiro. Então, comecei a juntar toda graninha que recebia (confesso que até a atualidade tenho o hábito de juntar moedas em cofrinho).

Aos 17 anos ingressei no curso de direito e fui ajudar meu pai no escritório (filho de peixe!). Então, com meu “enorme” salário de estagiário dei continuidade na reserva dos meus trocados.

No mesmo ano fui para Águas de Lindóia conhecer o Encontro Paulista de Autos Antigos. Eu conhecia somente por nome e tinha muita vontade de conhecer esse evento então as 4 gerações de Martos (meu falecido avô, meu pai, eu e meu priminho) embarcamos para um “Bate-Volta” de 700km.

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Para quem ainda não conhece esse evento, fica aqui uma recomendação: Você precisa conhece-lo! É a combinação perfeita para qualquer gearhead. Creio que dos eventos brasileiros todos precisam conhecer os encontros em Araxá, Sul Brasileiro, o Encontro Paulista (que mudou para Campos do Jordão) e o novo Encontro Brasileiro (que adotou a cidade de Águas de Lindóia dando continuidade à sua tradição).

Para quem conhece a cidade (e o evento) sabe que ali na Rua do Hotel Guarani ficam alguns carros exposto para venda. E não é que tinha um lindo VW SP2 1974 a venda com os dados do vendedor e preço. Na ocasião conversei com meu pai e achamos o negócio viável e anotamos o contato. Eu estava tão empolgado que não perdi tempo e já tirei a foto com o carro (que foi capa do meu Orkut por um bom tempo,rs!).

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Infelizmente, ao realizar contato com o proprietário ele nos informou que tinha vendido o carro no dia anterior. Sim. Foi o terceiro (e talvez mais factível) VW SP2 que eu perdi!

Contudo, não desisti… Continue procurando um VW SP2 que coubesse no meu pequeno bolso. Nessa época começou a popularização o site do “mercadolivre” que trouxe vantagens e desvantagens aos gearheads. Como positivo deve-se comentar que ficou bem mais fácil procurar carros por todo Brasil. Todavia, começaram a aparecer os primeiros malucos vendendo carros péssimos por preços proibitivos… Não tenho dúvidas que de essa onde corroborou pela alta vertiginosa no preço dos autos antigos.

 

A busca pelo tesouro perdido

Já com meus 20 anos e uma pequena reserva de dinheiro reforcei mais ainda minha busca pelo carro. Eu queria muito que meu primeiro carro fosse um VW SP2… Apesar de todos amigos da faculdades dizerem que eu deveria comprar um “popular”, eu já tinha me decidido… Seria um carro antigo, seria um VW SP2.

Assim, me recordo que consegui reservar a semana “do saco cheio” em outubro para visitar 2 carros em Sampa e tinham outros dois no sul, sendo um em Porto Alegre e outro em Curitiba (eram minhas “cartas na manga”).

Quando fui conhecer os carros de São Paulo tomei um choque! Ambos estavam maquiados e nada semelhantes com as fotos. Fiquei um pouco cabisbaixo e eu e meu pai fomos pernoitar no apartamento do meu irmão em Santo André.

Quando chegamos lá decidi ligar para o dono do VW SP2 de Curitiba e ele me disse que o carro ainda estava disponível. Todavia, ele foi claro comigo, avisou que tinha outro interessado que Belo Horizonte que estava indo lá ver o carro no dia seguinte e que não poderia segurar negócio para ninguém em razão das dificuldades peculiares da venda de automóveis antigos (precisa achar o dono certo).

Resumindo, o proprietário deixou claro que o primeiro que falasse a “cifra mágica” levaria o carro.

Desliguei o telefone, olhei para meu pai e fomos correndo ver passagens aéreas. Contudo, percebemos que os horários disponíveis iriam conflitar com o horário de chegada do outro pretendente (por volta das 11h) e o carro se tornaria um leilão e, por conseqüência, um péssimo negócio para quem finalmente o comprasse.

Diante dessa situação, não pensei duas vezes e falei para meu pai: “Estou muito ansioso e precisamos chegar lá cedo, vamos de carro que eu dou conta de dirigir!” (lembrando que já havíamos rodado 400km até São Paulo naquele dia, andado o dia inteiro para ver os 2 VW SP2 que eu tinha marcado visita e já se passava da 1h da manhã).

Eu estava decidido que não iria perder [pela quarta vez] um VW SP2. Deixei o cansaço de lado e sabia que se nos organizássemos rapidinho para sair, chegaríamos lá antes das 8h, dando o tempo necessário para ver, avaliar e negociar o carro.

Assim foi feito. Nos organizamos e antes da 1h da manhã já estávamos na estrada rumo a Curitiba. Paramos num posto para tomar café da manhã na entrada da cidade e às 07:30 chegamos na casa do proprietário do carro.

Quando vi o carro me apaixonei!

Infelizmente o carro também apresentava vários pontos críticos (como os outros), mas rolou uma química diferente com ele… apesar do carro estar longe da forma que eu esperava encontrá-lo acabei me encantando com ele.

No momento que o dono deixou eu e meu pai dar uma volta no carro, tive a certeza: seria ele. Um fato curioso é que o dono inicialmente deu uma volta comigo e meu pai e o carro pegou somente da 3ª tentativa. Quando eu fui dar a volta com meu pai o carro pegou de primeira (um bom sinal!).

Conversa vai… Conversa vem… Fechamos o negócio e finalmente adquiri um VW SP2. Contudo, um dos problemas mais graves do carro era o motor que estava claramente condenado. A cada acelerada jorrada óleo e o barulho estava longe do ideal. Logo, tive que providenciar uma transportadora para levar o carro até Franca/SP.

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Tive que esperar aproximadamente 20 dias, mas finalmente o carro chegou e estava na minha garagem… E assim começa minha real história com o VW SP2.

 

O Dionísio

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Finalmente chegou o momento de apresentar o Dionísio para vocês… Trata-se de um gaúcho, nascido em 1975 que passou por muita coisa nessa vida! Os próximos posts vão mostrar que o Dionísio era um Playboy na sua jovialidade, mas os anos não foram bons para ele e ele sentiu na pele toda a crise brasileira…

Ao longo dos anos 80/90 ele sofreu inúmeras pancadas e estava totalmente quebrado, tendo que se submeter a qualquer médico carniceiro que, por consequência, deixaram terríveis cicatrizes ao longo de seu belo corpo. E mais, quando eu o conheci ele estava muito gordo (cheio de massa) e precisando trocar o coração. Senti muita pena do Dionísio quando eu conheci ele, mas senti uma grande ligação entre nós e me comprometi em salvá-lo.

Quando o Dionísio chegou em casa alguns familiares chegaram na conclusão de que minhas bielas não regulavam… Infelizmente o carro não tinha condições de rodar, mas eu tinha zerado todas as minhas economias e tinha que esperar para desfilar com ele. Mesmo assim, passava todo o final de semana alisando e limpando sua pintura queimada e sonhando com seu retorno às ruas.

O primeiro passo para minha restauração foi a parte mecânica. Em que pese a necessidade de reparos na funilaria e pintura eu não conseguiria (pelo tempo e/ou pelo dinheiro) ficar 3/4 anos morrendo de ansiedade para rodar com meu carro.

Certamente, da mesma maneira que meus familiares me olhavam como maluca eu toquei o coração do meu pai e ele decidiu me presentear com uma mecânica totalmente nova para o carro. Foi o melhor presente do mundo!

Então, comecei a procurar igual maluco pelas peças do carro e também alguém para fazer o serviço. Por sorte encontrei uma oficina em Franca que é especializada em motores a ar e o seu proprietário era o mecânico chefe da concessionária da Volkswagen da cidade durante os anos 70 e 80, ou seja, era a pessoa certa para mexer no meu carro.

Quando meu carro chegou na oficina fiquei contente com a receptividade que o dono proporcionou ao meu carro… Ele disse que fazia tempo que não via um VW SP2 e iria se empenhar para deixar sua mecânica novinha em folha.

Como eu já citei no início do tópico, o VW SP2 tem um grave problema, falta de peça de reposição e/ou adaptável, ainda mais por eu querer reviver a mecânica original…. Aproveito para esclarecer que além do interesse na originalidade o apelo em manter a receita original do motor se dava por eu conhecer diversos SP2s que alteraram a potência do motor e sofrem as consequências até hoje, em especial com o super aquecimento do óleo do motor (outro problema do carro está justamente na pouquíssima ventilação do motor)… Então achei arriscado fazer qualquer tipo de alteração (seja para 1.9, 2.1 ou 2.5). Com o passar do tempo e teste na estrada fiquei feliz em confirmar que fiz uma escolha certa.

Foi muito difícil e teve um custo alto, mas depois de 2 meses eu havia conseguido encontrar tudo (carburador, monobloco, cabeçote, kit de pistão, embreagem, discos e demais equipamentos necessários). Então, chegou a hora de colocar a mão na massa.

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Revisão e acerto do câmbio

 

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Troca completo do freio a disco dianteiro

 

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Revisão e acerto da suspensão e freio traseiro

 

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Acerto da suspensão dianteiro e troca da caixa de direção

Na montagem de tudo houve um capricho fenomenal do Furlan (mecânico responsável), também agradeço a paciência dele por me receber diariamente para ver o carro.

Ufa!!!  Numa bela tarde o dono da oficina me liga e fala que o carro estava pronto… Abandonei tudo no serviço e fui correndo vê-lo… Me arrepio até hoje quando lembro a primeira vez que vi seu motor funcionando de verdade… Foi incrível!

Uma preocupação que assola quem tem um carro antigo é o vazamento de óleo do motor. Existe um ditado de que carro antigo que não vaza óleo é porque está completamente sem… Fico feliz por conseguir derrubar esse tabu! A mecânica do carro ficou excelente e nunca me deixou na mão ou marca de óleo por onde passou. Depois de rodar os primeiros 3 mil quilômetros o motor estava assim:

A partir de então o Dionísio se tornou meu Daily Drive, me acompanhando em toda minha rotina (Escritório, Fórum, Faculdade, Barzinho, Balada, Paquera e tudo mais que fosse necessário fazer de carro). Desfilar com ele era moleza, o grande problema era fazer baliza todo engravatado (nessa hora sentia falta da direção hidráulica e do ar condicionado). Outro probleminha é aquele cheiro gostoso da gasolina queimando no motor, mas infelizmente nem todas as garotas que eu conhecia pensavam igual.

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Ao longo dos 2 anos e meio seguintes o Dionísio foi um grande companheiro, jamais me deixando na mão, nesse tempo rodei mais de 6 mil quilômetro da mais pura alegria. Inúmeras histórias durante “os melhores anos da minha vida” e certamente o carro mais conhecido da galera (apesar de Franca ter aproximadamente 350mil habitante ele é o único VW SP2 vermelho da cidade; pelo menos que sai na rua). Passado esse período eu consegui comprar um carro para meu dia-a-dia e dei um pouco de descanso para o Dionísio, tornando-o meu carro de final de semana e de voltinhas em encontros de autos antigos na região.

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Como vocês já devem imaginar, eu entendo que carro foi feito para rodar…e muito! Então, mesmo não apresentando a melhor aparência externa (mas confiante no que estava por debaixo do capô e nos itens de segurança), tive a oportunidade de participar de inúmeros eventos com o Dionísio. Nunca tive medo de encarar viagens de 400km o dia com ele… Pelo contrário, seu comportamento da estrada, misturado com aquele cheiro de gasolina é o meu ópio.

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Como devem imaginar, ainda terão outros diversos causos a serem compartilhadas nos próximos post…. Por hora é isso pessoal, espero que tenham gostado de conhecer o começo da minha história, obrigado pela paciência e até em breve!

Por Fred Martos, Project Cars #151

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