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Carros Antigos

Uma viagem de oito cilindros: de Brasília a Florianópolis com um Dodge Dart 1973 – Parte Final

Quando o leitor Guilherme Altomar precisou mudar de Brasília para Florianópolis devido ao seu trabalho, ele não pensou muito para decidir juntar alguns amigos e levar seu Dodge Dart rodando pelas estradas do país em vez de embarcar o carro em um caminhão.

Como toda boa viagem embalada por um carro bacana e boas companhias, ela rendeu uma bela história que vale a pena ser compartilhada. Há pouco menos de um mês publicamos a primeira parte (que você pode ler neste link), na qual Guilherme falou sobre os preparativos para a viagem e sua relação com o carro. Agora, chegou a hora de cair na estrada. Boa leitura!

A preparação para a viagem começou numa terça-feira, quando cheguei em Brasília ainda pela manhã. A ideia era sair na sexta-feira, dia 31/10 e chegar domingo, dia 02/11 em Floripa. Fizemos uma lista dos itens que deveriam ser checados nos carros e não podíamos perder tempo. Os carros ficaram em lugares distintos em Brasília, o Jegue Lee ficou na casa do Mário e o Dart 76/77 ficou na chácara do Marcelo. Dois super amigos que deixarão saudades.

Levei o Dart 76/77 para a casa do Mário e começamos a “debulhar” os dois. Falo “começamos” porque o André Monc (mundomonc.com) também ajudou na preparação. Ele queria conhecer melhor os carros e não somente entrar e dirigir os quase 2.000 km. Vai que o Jegue empaca na hora dele dirigir, né? Quem gosta sabe que temos uma interação com nossos brinquedos, e às vezes quase nos esquecemos de que são seres inanimados.

Pois bem, revisamos os tanques de combustível dos dois carros, pois as boias não estavam bem fixadas e vazavam muito. No 76/77 precisamos baixar o tanque inteiro, pois a boia (não mais a original) batia no fundo do tanque e não permitia uma vedação perfeita no encaixe com o tanque. Ajuste feito, boia pra dentro e trava apertando perfeitamente. Trocamos algumas mangueiras ressecadas e nos demos por satisfeitos. Sem vazamentos.

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Já o tanque do Jegue, que troquei por um de polietileno, me deu mais trabalho porque a trava de baquelite que pressiona a boia perdeu a rosca e não dava aperto. Tentei mais uma vez girar a trava e achei que era o suficiente. Outros itens da lista estavam esperando ansiosamente.

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A grande alteração que eu estava ansioso por realizar era das rodas traseiras do Jegue. Na última viagem ao Mopar Nationals 2013, uma das rodas me deixou na mão. Ela já tinha passado por um torneiro anos atrás e não aguentou as altas temperaturas da viagem. Acabou se deformando sem muito esforço. Para trocá-las eu comprei duas rodas do mesmo modelo (Torq Thrust II), porém aro 16, calçadas com pneus 245×50. Ficaram lindas!

Trocamos óleo dos carros, água dos radiadores, calibramos os pneus, arrumei a parte obrigatória (triângulo, extintores e macaco novo para o 76/77), probleminha na parte elétrica do 76/77, peças sobressalentes para uma viagem tão longa, tanques abastecidos e….. pronto. Tudo pronto para a viagem.

Saímos bem cedo na sexta-feira, ainda escuro. Resolvi ir pelo caminho mais curto. Afinal estava viajando com dois V8tões e não dá pra bancar o fodão. O Jegue Lee bebe mais que eu no fim de semana (3 km/l com álcool). O 76/77 até que fez bem, 6,5 km/l na gasolina. Então tinha que ir pela rota mais curta mesmo, sem choro.

Tínhamos algumas previsões de parada no caminho, mas tudo iria depender do rendimento dos dois carros. O Monc começou a compartilhar a viagem no seu facebook e, depois disso, muitos dodjeiros ficaram curiosos com a viagem e se dispuseram a nos ajudar pelo caminho, caso tivéssemos algum problema, ou mesmo pra curtir com a gente por um trecho quando passássemos. Com isso, ficamos sabendo do 2º Encontro de Dodges de Nazaré Paulista (SP). Sairíamos um pouco da rota, mas valeria muito a pena. Outro Dojeiro nos chamou para entrar em Joinville (SC) para vermos sua coleção de Dodges. A galera dos Dodges é muito bacana. Isso não tem preço!

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Voltando à estrada, fiquei (Jegue Lee) sem álcool logo no primeiro tanque, a exatos 50 metros do posto. Sabem quantos km rodei? Pois é, 100 km. Isso me fez pensar que eu teria que parar a cada 100 – 120 km em uma viagem de 1800!?!?!?!?! Paciência Guilherme, paciência. Coloquei o galão de 20 litros reserva que levei e acabei de chegar no posto. Esse seria o lugar mais visitado da viagem, postos de gasolina!

A história dos abastecimentos foi essa. A cada dois abastecimentos no Jegue, um no 76/77.

O primeiro dia de viagem ainda guardaria mais surpresas, rsrsrs. A cada km percorrido, a confiança nos carros também ia crescendo. Por mais que você prepare tudo, sempre vai ficar uma pulga atrás da orelha, “será que vai aguentar?”. Com isso, o pé direito também ia ficando inquieto lá embaixo. Pois bem, a uma certa velocidade 1XX km/h, o Jegue já não galopava sereno. Tinha uma vibração que ainda não identifiquei. Cardã desbalanceado? Rodas desbalanceadas (acho que não)? Motor tenho certeza de que não era. Falo isso porque a tal tampa de baquelite do tanque de combustível parece que afrouxava com a vibração, e num determinado momento, segundo o Monc que vinha na cola, começou a jorrar álcool. Paramos em um posto (nossa, um posto, incrível!). Encostamos o Jegue na vala e começamos a trocar ideias sobre como arrumar o troço. Diminuímos o prejuízo do vazamento para míseros um pingo a cada cinco segundos. Apesar do atraso, colocamos os carros de volta na estrada e seguimos.

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O ritmo não estava dos melhores. Muitas paradas para abastecimento atrasam o ritmo. Chegando perto de Ribeirão Preto (SP), em mais uma “incrível” parada para abastecimento, ficamos sabendo que tinha um acidente à frente e que estava tudo engarrafado. Encostamos os carros no acostamento logo após o posto e começamos a conversar sobre a viagem. Esperar o trânsito diminuir, porque eu não ficaria de primeira marcha ali nem a pau. Como disse no post anterior, a embreagem do Jegue Lee está muito pesada (cerâmica) e fica impraticável andar em congestionamentos. Perdemos mais de 1 hora, tranquilo.

 

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Na manhã seguinte (dormimos em Ribeirão Preto mesmo), após andarmos somente 697 km, paramos em uma loja de pneus para levantar o Jegue num elevador e dar uma checada nos apertos de suspensão. Na verdade era para tentar achar a causa da vibração, mas tudo pareceu estar em seu devido lugar. Só que nesse momento (dodgeiro é tudo sangue bom mesmo né?) parou um sujeito de moto e se apresentou como sendo o Zé dos Dodges. – “Vamos ali em casa pra vocês verem minha oficina”. Lá fomos nós para conhecer a casa/oficina dele. Mais uma amizade que conquistamos. Depois disso…. estrada rumo a Nazaré Paulista (SP).

Neste trecho até o 2º Encontro de Dodge de Nazaré Paulista, não tivemos problemas. Belas estradas, muitos pedágios (mas passamos direto por eles – Sem Parar foi ótimo aliado para fazer render a viagem), mas também muita emoção! Foi neste trecho que os animais mais sofreram com o peso… dos nossos pés (estão entendendo?). Serei bem econômico nas palavras: SLK 250, BMW X1, Corolla, entre outros, foram os caras que, pela primeira vez eu acho, viram como um Jegue pode ser realmente rápido!

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Já o Dart 76/77 ia devorando quilômetros e mais quilômetros sem a menor cerimônia. Carro incrível. A não ser pelos pneus dianteiros que são velhos (já estou providenciando a troca), o resto não nos dava qualquer preocupação (para a alegria do Flávio – antigo dono e super amigo também).

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Ao chegarmos até o local do encontro tive uma surpresa. Acabou a gasolina do 76/77 dentro do local do evento! Parece que é mentira mas não é. E como não tínhamos um galão para gasolina, o carro ficou ali mesmo onde parou. Sério, não colocamos o carro nesta posição de propósito.

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Errei o caminho até o local onde estavam os carros do encontro e não consegui mais tirá-lo dali. Claro que depois o pessoal do encontro me cedeu 5 litros salvadores e pude chegar até um lugar que ainda não tinha ido: um incrível posto de gasolina (p&¨%$*@¨$u). Mais uma história pra contar! Sei que vão me chamar de pescador mas foi verdade, eu juro.

 

O Encontro de Nazaré Paulista

Com uma chegada triunfante (a falta da gasolina), logo começamos a nos apresentar ao pessoal do encontro, ainda meio sem jeito. Mas, logo reconhecemos alguns amigos de outros encontros, como o Fernando Demarco, o Marcelo Razão, o Glauco Ribeiro, o Tomate, o Dennis KM, o Luciano Gimenes, o Rodrigo Guedes entre outros. Também tivemos a oportunidade de conhecer vários amigos que até então conhecíamos apenas da internet e do insanamente perigoso grupo Dodges do Brasil, no Whatsapp. O Monc então virou personalidade rapidinho, “você que é o Monc? Do Blog?”. Como não podia deixar de ser, Monc sacou sua super câmera e começou a registrar o evento. Algumas das fotos aqui são dele. Ouvimos muitas histórias legais, brincadeiras saudáveis como sempre e um calor danado.

Os Dodges presentes foram a grande atração. Carros extremamente impecáveis e outros ainda virgens ocupavam a grama da marina. Destaque para um Dart SE Branco, que apesar das marcas do tempo, deu um show. O Charger azul meia-noite do nosso amigo Ração também estava presente. Conhecemos o Dart 1972 do nosso novo amigo Gladson, que tem uma história incrível e é 100% original. Nosso amigo Tripé tirou gasolina do seu Dart 1979 para ajudar com nosso probleminha de combustível. É impossível comentar todos, mas cada Mopar chamava atenção para um detalhe.

Também compareceram Dodges importados como o Roadrunner survivor, que o Demarco recentemente importou e foi apresentado no último Mona. O famoso Plymouth Fury 1966 também marcou presença. Até que, pouco antes da forte chuva, chega um Dart nacional 1972, travestido de 68/69 americano. A imponência do carro parou o evento e logo todos estavam ao redor do carro checando os detalhes. Recentemente construído, como o para-brisas dianteiro que foi colocado no dia anterior ao evento, seu dono Alex Agapito estacionou orgulhoso.

Um belo lugar, um belo encontro, pessoas amigas e solidárias, mas tínhamos que continuar nossa jornada. Neste dia, foram apenas 300 km rodados e eu queria andar um pouco mais para que no domingo não faltassem muitos quilômetros. A partir dai, entramos na parte mais tensa da viagem.

Seguimos as dicas do pessoal do encontro e pegamos a Fernão Dias, rumo à cidade de São Paulo. Até aí tudo ótimo! Porém, o GPS do Monc avisou que tínhamos que entrar à direita para que pudéssemos chegar até o Rodoanel Mário Covas. Fizemos outra inesquecível parada em um posto de gasolina, já era noite, tipo 8 horas. Os frentistas confirmaram o desvio, mas um deles falou que seria perigoso àquela hora, mas os demais acabaram nos convencendo, apesar de ter soado um tanto estranho. Não conhecíamos nada, à noite então… foi tenso. Mas fomos adiante. Pra quem é de São Paulo vai saber do que estou falando. O caminho até o Rodoanel passava “somente” por Franco da Rocha e Caieiras. Um p… caminho danado de perigoso. Sinistro demais. Não dava pra andar a mais de 60 km/h. O Jegue com a embreagem dura pra caramba, os dois carros barulhentos demais (o 76/77 muito mais), placas de fora, carro de polícia seguindo a gente num trecho (claro que não tinha nada a ver, mas vai saber né?) numa região totalmente desconhecida….cara, foram quilômetros muito tensos. Muito ruim de verdade. Que trecho é esse? Quem conhece, por favor, escreva na área de comentários pra gente saber se o que passamos foi ou não realmente perigoso.

Não chegava nunca! Entramos no Rodoanel. Puta diferença! Colocamos os braços pra fora e comemoramos acelerando forte os animais Ufa! Daí pra frente foi bem mais tranquilo. Hoje, acabei de refazer o trajeto pelo Google Street View e vi que erramos mesmo o caminho!

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Mais uma espetacular parada em um posto e aproveitamos pra esticar até Miracatu (SP), onde dormimos. Não antes de descer a Serra do Cafezal, naquela que é considerada uma das mais perigosas rodovias do país, a Régis Bitencourt (BR-116). E pra variar, trânsito intenso de caminhões a 20 ou 30 km/h e uma neblina bem chata. Nem pra apreciar a mata atlântica dava. Já devia ser umas 22:00 quando paramos em Miracatu (SP), mas felizes por andar outros 232 km neste dia, restando para o domingo, aproximadamente 555 km.

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Animais descansados, os quatro, voltamos para a estrada com o espírito de completarmos a viagem. Sem apertar muito o pedal da direita. Apenas curtir e chegar em casa. Uma paradinha pra trocar um fusível no 76/77 e seguimos à diante.

“Causo” interessante foi o que encontramos ao contornar uma simples curva da estrada. Agora não vou saber direito aonde estávamos, mas, bem no meio da curva me deparo com um Volvo V60 atravessado na pista depois de entrar de frente na mureta de proteção interna da curva. Com certeza perdeu a traseira e não conseguiu controlar. O problema é que tinha uma carreta dessas de carregar trator que também foi pega de surpresa e estava tentando passar pela pista da esquerda quando chegamos eu e o Monc. Resultado…. travamos as patas e ficamos vendo aquele monstro de aço se aproximando. Parei a menos de dois metros do caminhão, já com todas as rodas no acostamento e o Monc quase passando por cima de mim! Outros carros chegavam rápido e, igualmente, tinham que frear super forte pra ninguém bater.

Recorte da Chegada

Após o caminhão se livrar do Volvo, passamos devagar e oferecemos ajuda, mas o cara estava tão envergonhado (eu acho), que sequer deu bola pra gente “Imagina se esses carros velhos podem me ajudar!” Seguimos!

Gostaríamos de ter feito contato com amigos de Curitiba, passar em Joinvile (fiquei na vontade!!), mas teríamos que ter programado a viagem de outra maneira. Não sabia que iríamos ter tanta companhia assim. Na segunda eu já precisava trabalhar e o vôo do Monc de volta a Brasília era na segunda bem cedo. Optamos por ir direto até Floripa.

Passamos pelo entorno de Curitiba e a vontade de entrar na cidade era grande. Afinal, ali estão alguns dos carros mais rápidos do Brasil. Quem é um gearhead talvez concorde comigo. Além, claro, de possuírem grupos de antigos e serviços especializados que são referência para nós.

Após a passagem pelo entorno da capital paranaense foi a vez de descer a Serra do Mar. Essa, por sinal, um pouco mais agradável de descer do que a anterior ainda no estado de São Paulo. Apesar do mal tempo, foi legal a passagem pelo trecho. Como disse anteriormente, a intenção neste dia era chegarmos em casa sem problemas. A partir daí não tivemos novidades, somente repetitivas paradas para abastecimento e os odômetros registrando os km percorridos.

Tivemos a grata surpresa de sermos recebidos, ainda na BR 101 já perto de Floripa em um posto da polícia rodoviária, pelo agora amigo, Rildo e seu Dartão com Blower (muito bem feito, por sinal). Foi sensacional a recepção dele. Nos conduziu até a entrada da cidade onde nos despedimos, certos de termos companhia pra tomar umas cervejas.

Chegando no cartão postal de Floripa, a ponte Hercílio Luz, uma chuvinha mansa nos abençoou. Fiz mais um filme com a GoPro, e a sensação de realização foi incrível. Finalmente os carros estariam ao meu lado, onde agora, posso passar meus raros momentos de lazer com ele. Comemoramos com os braços pra fora do carro como quem faz um gol, ou alcança o cume de uma montanha.

2155 - Chegada em Floripa - do vídeo da GoPro

Agora, meus animais descansam sob minhas asas, prontos pra desbravar este belo estado, cheio de paisagens e lugares maravilhosos.

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Obrigado ao Monc por me ajudar a trazer o carro. Obrigado ao FlatOut pela oportunidade de fazer parte deste universo virtual. Obrigado aos que participaram direta ou indiretamente da viagem e um obrigado especial aos leitores daqui do site. Até a próxima! V8 na veia!