FlatOut!
Image default
Técnica

Você já viu um motor diesel “disparado”? Veja como e por que isso acontece

Talvez você já tenha ouvido falar de algum caminhão ou picape diesel cujo motor “disparou” e só foi parar quando acabou o diesel. Não é exagero, nem história de mecânico (a versão gearhead de história de pescador, você sabe…). Esse tipo de coisa acontece mesmo. O motor começa a acelerar repentinamente e não pára mais. Veja por exemplo este vídeo de um motor Detroit Diesel sendo ligado depois de 30 anos parado:

Assustador, não? É como se fosse um monstro que desperta furioso de seu sono, pronto para destruir aqueles que ousaram incomodá-lo.

O motor a gasolina usa uma válvula borboleta controlada pelo acelerador para controlar o volume de ar e, consequentemente, o volume de combustível para controlar a velocidade do motor. Nos motores a diesel o princípio é um pouco diferente: não há válvula borboleta, e a velocidade do motor é controlada pela variação de combustível injetado nos cilindros. O acelerador do motor a diesel atua sobre uma bomba injetora que regula o volume de diesel a ser enviado ao motor.

O diesel não usa velas de ignição para sua combustão — sua ignição se dá pela injeção do combustível no ar comprimido e aquecido nos cilindros. Por isso, se o diesel começar a ser injetado nos cilindros sem regulação de pressão ou volume, o motor pode acelerar descontroladamente. Essa aceleração involuntária e descontrolada é chamada de “diesel runaway”, também conhecida como “motor disparado” no Brasil. Mas como isso acontece? De várias formas diferentes, como veremos adiante.

Na primeira delas, em motores mais desgastados, onde há folga entre os pistões e as paredes do cilindro os gases da combustão podem passar pelos lados dos pistões e entrar no cárter e levar névoa de óleo para a admissão. Como o óleo lubrificante tem propriedades de combustão semelhantes ao do diesel, o motor acelera com essa injeção extra de combustível. Quanto maior a velocidade do motor, maior o volume de névoa de óleo forçado pelo respiro do cárter, causando um ciclo de alimentação do motor que pode levá-lo ao consumo total do óleo lubrificante e à consequente quebra — geralmente uma explosão como esta:

Essa alimentação cíclica de óleo lubrificante também pode acontecer se você colocar óleo lubrificante demais no motor — é por isso que os manuais são enfáticos: nunca coloque mais óleo do que o recomendado. Isso por que em vez de vapor ou névoa de óleo, quem pode subir pelo respiro é o próprio óleo lubrificante, que causará o mesmo “disparo” do motor.

A situação mais comum, contudo, é a que vemos no vídeo acima: uma falha ou má regulagem da bomba injetora ou do acelerador. No caso do vídeo, o cara aparentemente estava regulando o ponto da bomba injetora quando algo deu errado e o fluxo de combustível deixou de ser controlado pela peça, alimentando o motor como se o acelerador estivesse totalmente pressionado. O aumento da velocidade do motor faz com que o óleo comece a subir pelos respiros, mantendo o motor em ciclo, como nos outros casos.

Ao perceber que seu Detroit Diesel disparou, o cara toma uma atitude tão corajosa quanto perigosa. Ele pega um pedaço de borracha ou lona e tenta controlar a única coisa que está ao seu alcance: a admissão de ar do motor, causando o afogamento da máquina. No processo ele poderia ter perdido os dedos, mas felizmente apenas quebrou as pás da turbina.

Se você está se perguntando por que ele não entrou na cabine e desligou o motor, é por que os motores diesel, como dissemos antes, não têm centelha para ignição. O desligamento do motor é feito pelo corte de combustível. Como a peça responsável por cortar o combustível havia quebrado em sua mão, a única solução era afogar o motor. Mesmo assim o procedimento é perigoso: o motor pode literalmente explodir dependendo da velocidade e quantidade de combustível, e não é preciso usar muito a imaginação para saber o que acontece quando um motor cheio de óleo e ferro quente explode.

Hoje, com os motores a diesel controlados eletronicamente isso é mais difícil de acontecer, especialmente por que os motores modernos têm sistemas de segurança para fechamento da admissão, o que causa o afogamento do motor. Isso também mostra a importância de realizar os procedimentos corretos de manutenção e de verificar a condição dos componentes antes de tentar colocá-los em funcionamento.